sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Geraldo tem sonhos ainda maiores sobre duas rodas

                                              
by Haroldo Gomes

O amor de Geraldo Souza Júnior pelo esporte sobre duas rodas começou quando ele tinha 12 anos. Tudo por conta do pai, seu Geraldo Souza (hoje, aos 61 anos), que costumava participar de corridas de bicicletas em datas comemorativas em Castanhal, como o 7 de setembro e 15 de novembro. Desta forma, ele e os outros irmãos foram seguindo o exemplo do pai, daí por diante não pararam mais de competir e de buscar melhores resultados através do esporte. Dos quatro irmãos que começaram, hoje, apenas Getúlio e Geraldo perseveram no ciclismo.

Somente aos 16 anos foi que Geraldo começou a competir, e de forma inusitada. O irmão, Gilson, não conseguiu completar a prova de que participava. Como os dois são parecidos e usavam o mesmo uniforme, meio que no impulso, Geraldo pegou a magrela e deu sequência à prova, parando duas voltas depois (risos ao lembrar do fato). Depois vieram outras compe-tições mais organizadas em outros municípios da região, das quais ele e seus três irmãos sempre se esforçaram para participar, muitas das vezes sem patrocínio. Houve momentos em que para eles competirem precisaram montar as magrelas emprestaando peças das bicicletas de amigos.

Humilde e de família que mora na agrovila Boa Vista, em Castanhal, Geraldo (29 anos) sabia que os obstáculos seriam superados com o tempo, a prova disso, foi a sua indicação há dois anos para participar de uma equipe de ciclismo no interior de São Paulo. Para chegar lá, contou com o apoio incondicional da esposa Amanda Suzana e da família.

Para muitos que viram e ouviram o nome de Geraldo Souza ecoar durante a chegada na reta final da prova e durante a premiação, no domingo (3 de janeiro), em Interlagos, trata-se de um simples atleta que levou sorte. Mas basta acompanhar o dia-a-dia dele para perceber que Geraldo respira ciclismo. Mesmo de férias, não deixou de treinar todos os dias, já pensando nas competições que vai disputar ainda este mês.

Sem o tradicional uniforme, bem à vontade na sala da casa da família, na véspera da viagem de volta a São Paulo, ele me recebeu para esta entrevista onde revela detalhes do bom momento que vive no esporte e também para mostrar sua indignação com relação à falta de apoio do empresariado local.

Haroldo Gomes - Pelo fato de você, no começo da carreira, treinar no intervalo do almoço – em pleno meio-dia - e de ser considerado doido por muitos, foram os motivos que o levaram a perseverar no esporte?

Geraldo Souza – Também. Era o único horário disponível que eu tinha para treinar, já que à noite eu estudava. E se furasse o pneu, eu sabia que ia chegar atrasado ao trabalho. Eu ia geralmente a Santa Izabel, a cada semana eu tentava baixar o tempo. Sempre procurando melhorar o índice.

HG – Tudo que está se passando na sua cabeça deve ser como um filme com final feliz. Antes da prova, você imaginava que o desfecho poderia ser este?

Geraldo Souza – Já. Eu sei qual é a repercussão de uma prova como a Copa América de Ciclismo para quem vence. Na ida para o local da competição, eu estava muito pensativo, e também um pouco chateado. Eu queria levar minha esposa para lá, mas o treinador não permitiu. Durante o percurso, eu lembrei que o meu grande sonho era pelo menos completar a prova. Já que todos os outros atletas do Pará que foram, jamais conseguiram completá-la. E eu imaginei como seria o sabor de vencer a competição. O meu grande sonho então era vencer esta competição e fazer diferente. Eu senti que poderia vencer já que este é o meu tipo de prova e eu estava bem preparado. Na véspera da prova, ficou decidido que os outros colegas da equipe iriam trabalhar para que pudesse vencer. Procurei estar sempre entre os primeiros, para que ao final eu pudesse dar aquela arrancada para a vitória.

HG – Geraldo, você saiu do anonimato para escrever seu nome na história do ciclismo do Pará e do Brasil. Como você pretende administrar as futuras cobranças?

Geraldo Souza – Trabalhando, e claro, focando as outras competições ao longo do ano. Eu treino forte todos os dias para vencer, mas sei que nem sempre isso é possível, e sei também que se não obtiver resultados tão expressivos, as pessoas vão entender.

HG – A partir de segunda-feira, voltam as rotinas dos treinos. Quais e onde serão as próximas competições?

Geraldo Souza – Dia 24 deste mês tem competição em Poços de Caldas, em Minas Gerais. E de 3 a 7 de fevereiro, o Torneio de Verão, em Santos (SP). E no final de Fevereiro, a competição mais importante: Giro no Interior, são cinco dias de competição, também em São Paulo.

HG – Se houver mais investimentos no ciclismo, você acredita que outros atletas paraenses podem chegar aonde você chegou?

Geraldo Souza – Claro que sim. Aqui tem muitos atletas com potencial enorme. Lá em São Paulo, tanto as empresas quanto as prefeituras procuram os atletas para patrocinar. Aqui, é completamente diferente. Apenas o prefeito Hélio Leite tem se sensibilizado com o esporte. Só para você ter uma idéia, eu estou aqui há 15 dias, nenhum empresário de Castanhal me procurou para perguntar se eu preciso de apoio. Isso me indigna muito. Comigo deu certo porque eu fui na cara e na coragem; mas sei que muitos não têm a mesma disposição.

HG – Se houver uma maior organização, num futuro breve, você pensa em vir a competir representando Castanhal?

Geraldo Souza – Claro que sim. Se houver apoio das empresas e as equipes se profissionalizarem, passando a pagar um salário digno aos atletas, material de treino e de competição será muito melhor competir representando a minha cidade, o meu Estado.

HG – É possível recordar um momento durante sua trajetória em que você pensou em desistir e por quê?

Geraldo Souza – Assim que eu casei, ficou difícil manter o esporte e a família. Piorou quando a esposa engravidou. Eu ganhava muito pouco. Durante esta fase, aqui no Estado, eu ganhei todos os títulos que podia ganhar, fui pentacampeão paraense e nunca fui reconhecido. Pra piorar, a SEEL tirou a minha bolsa de incentivo para treinar. Mesmo assim, minha esposa sempre incentivou, às vezes, a gente deixava de compra alguma coisa para casa, para a filha Samantha Gabrielly (hoje com 1 ano e seis meses) para comprar peça para a bicicleta para que eu pudesse competir.

HG – Geraldo, você é muito focado ao esporte que pratica. Mesmo de férias você treina todos os dias, este é o segredo do sucesso?

Geraldo Souza – Eu fico agoniado se passar dois ou três dias sem treinar. Fiz um esforço tremendo para trazer minha bicicleta. Não treinei muito, mas o suficiente para manter a forma, isso é que é importante, estar sempre bem focado nos objetivos. Só para se ter uma idéia, para a Copa América eu treinei durante o Natal e Ano Novo. Se não houver abdicação de alguns prazeres o objetivo não chega nunca.

HG – Com tanta dedicação assim, pode-se esperar ainda muitos resultados bons ao longo deste ano?

Geraldo Souza – Claro que sim. Eu estou bem, treinando forte. Durante estes dois anos lá fora ganhei mais experiência e ritmo para competições importantes. (HG).