terça-feira, 20 de dezembro de 2016

CRÔNICA DA SEMANA_20_12_2016_THO HG

Entre bulas e receitas de bolo

Pela crescente onda de protestos e críticas direcionadas à classe política (ou a grande parte dela) que ocorre intensamente país afora tem como pano de fundo o não cumprimento do Artigo 5º da Constituição Federal. O qual diz “que todos sem distinção somos iguais perante a lei”. Um dos questionamentos se fundamenta pela distinção que há entre o poder exercido pelo povo e o exercido pelas autoridades constituídas. No tocante aos políticos, os do Legislativo têm a prerrogativa de criar leis e definir seus próprios salários, como também do Executivo e do Judiciário. É uma prática viciosa e perigosa semelhante ao enredo de novela das seis, em que o diretor coloca um bando de macacos para cuidar do bananal. Uma hora as bananas acabam. E quando isso ocorre, sobram apenas cascas e prejuízo. Como agora. E agora?
Não existe uma regra geral, uma vez que há exceções. Mesmo que raras. O que não é o caso de um antigo amigo; não sei se ainda é, pois ao entrar para a política ele me veio com essa pérola: “amigo, democracia só existe nas urnas”. Em partes ele tem razão. De fato, nossa frágil democracia funciona como bula de remédios. Como aquelas que vêm com o modo de usar escrito com letrinhas minúsculas (quase um teste para quem tem problemas na visão) na maioria das vezes não as lemos. Exceto quando nos automedicamos. Em geral, elas dizem uma coisa; e os médicos outra. Por analogia é como a gente ter que votar e escolher nossos representantes com uma intenção baseada em suas promessas; uma vez eleitos eles assumem outra forma de usar as leis e o poder em benefício próprio. E aí chegamos nesta queda de braço: mandamos leis de iniciativa popular para eles, e eles as desfiguram. Isso quando aprovam, como ocorreram com as Leis da Ficha Limpa e Anticorrupção.  
O escritor Rubem Alves diz que “a poesia é a ação do poeta na maneira de ver o mundo de forma diferente das demais pessoas. A beleza dessa ação chama-se metáfora”. Há sempre uma para cada situação. Claro, depende muito do poeta. Assim sendo, fica fácil de perceber que milhares de novos poetas estão surgindo e indo às ruas para contestar o país que é visto de forma dicotômica; bem diferente da que nossos representantes veem. Não há beleza alguma na miséria, na falta de médicos e remédios, de emprego, de renda... Para desnivelar ainda mais a balança, do lado do trabalhador, o Governo Federal congelou os investimentos por até 20 anos em setores vitais como saúde e educação. E assim, nesse continuísmo sem fim, nossos políticos seguem firmes a regra da receita de bolo: quando o orçamento mingua e falta fermento para aumentar suas fatias do bolo, a regra é aumentar a contribuição do trabalhador. Agora, até os idosos entraram na lista desses ingredientes. Com idade mínima de 65 anos para se aposentar vai precisar de muita sorte para usufruir deste benefício. 
Sem muito poder de reação, de nossa parte, o país sucumbe com a pandemia econômica que atinge a União, estados e municípios. Imersos em dívidas, quebrados, falidos, por teimosia de seus gestores que insistem na mesma receita: gastar mais do que arrecadam. Porém, na outra ponta da situação vemos a mesma prática viciosa há décadas. Gastança com assessores especiais, nepotismo, desvio de finalidades do dinheiro público, corrupção, sem falar nos aumentos desnivelados de seus salários e mordomias, aliás, muitas mordomias. Ai, chegou a conta, e como habitual, empurrada para o trabalhador. Ao longo do tempo o brasileiro vem aprendendo que o prato pode ser indigesto, aqui ou em qualquer lugar, mas o sabor, não. Para que isso ocorra, basta trocar de cozinheiro ou de restaurante. Nas ruas, nas redes sociais, nas igrejas e nas universidades ecoam vozes que querem de fato poder exercer o seu direito, que é trocar o cozinheiro-chefe, e assim podermos sentir o sabor dos direitos respeitados; do contrário, em breve não haverá ingredientes, e voltaremos à barbárie, como já acontece em muitos países latinos.
A língua é a beleza do mundo, capaz de aguçar nossa imaginação, de tingir pictoricamente um quadro denunciando as traquinagens dos que dela por meio de seus discursos vazios e sem fundamentos tentam furtar sua beleza. Não é lúdico que muitos políticos – sem generalidades – pensem o mundo pelo olhar de uma criança, em que todos os absurdos são permitidos. 
Não somos mais os mesmos. O país não é mais aquela creche de tempo integral em que os pais retornam ao fim do dia só para pegar os filhos sem se importarem com o que eles fizeram durante o dia. Por que, neste caso, o problema é da escola. Na nossa democracia é de todos. E dela temos que cuidar mesmo que não gostemos de política, é por meio dela que todas as decisões são tomadas e de alguma forma elas afetam o agora, o amanhã. Leiamos as bulas e ousemos participar adicionando outros ingredientes à receita, antes que o bolo simplesmente de fato acabe.

Por Haroldo Gomes

quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

CRÔNICA DA SEMANA_15_12_2016_THO HG

Ontem fui à livraria


Algo de mais em ir a uma livraria? Depende! A resposta é relativa. Talvez seja porque não encontramos livros e livrarias em toda parte e muito menos um grande número de títulos como a que encontrei ontem. Fato é que entrei nessa viagem por acaso. Uma possível explicação seja o clima de fim de ano. Estava eu apenas acompanhando a família num passeio pela capital, e em dado momento minha sobrinha teimou em querer ganhar de presente um livro. Quando me dei conta estava em meio a eles, folheando-os com a mesma sensação que uma criança tem quando ganha um brinquedo.
Entre Nélidas, Ferreiras, Maxes Martins, Rubens Alves, Pessoas, Clarices, Veríssimos, e tantas outras obras de cânones da literatura brasileira minha decepção só não foi maior porque eles não tinham o preço expresso, como é comum nas livrarias que havia visitado até então. Quando indaguei ao vendedor, fui informado que era só passar o código de barras numa maquininha leitora próximo ao caixa. Por estar descapitalizado naquele momento, foi até melhor não saber mesmo.
Do momento da concepção à distribuição há um longo caminho que os livros percorrem até chegarem em nossas mãos. Acho que é por isso que não temos lá aquela habilidade com a leitura e com os livros. Além de caros, encontrar boas livrarias em nosso estado é como procurar agulhas no palheiro. Mas naquele momento único, em meio à procura do que nem sabia o que procurava me vieram alguns devaneios:
Um deles foi me perguntar por que meu livro ainda não estava ali, no meio daquelas obras? É, tenho um livro de crônicas revisado, diagramado, pronto para a impressão: é um apanhado de escritos ao longo de vinte anos em que me aventuro a escrever. Mas antes disso tem aquela barreira que é o lado financeiro; na outra ponta da situação tem ainda o mercado com suas burocracias que freia nossas intenções de materializar tais desejos. Pensamentos vãs, e eu, ali, encantado, pegando cada um deles como se pega um cristal fino com o receio quebrá-lo.
Naquele momento ímpar me veio também outras memórias, como o convite para fazer parte de Academia de Letras. E eu convicto com o propósito relutante de sempre, e reafirmo: sem obra, não existe escritor. Salvo engano após morte, que é quando surgem interesses e a coisa anda, enquanto o autor perece no túmulo. Todo grupo social tem suas vaidades veladas, e isso me fez lembrar do saudoso Ferreira Gullar que também resistiu muito até fazer parte da Academia Brasileira de Letras. Ele devia ter os seus motivos, embora tenha escrito e publicado suas obras ao longo de sua vida. Mas, enfim, muita gente prefere o mérito sem ter algo que o justifique.
Depois de algumas horas percorrendo prateleiras, livros e mais livros, fui convidado a acordar com a sutil dica de que era hora de irmos embora. Tudo que é bom tem data de validade; a minha acabara ali. Ao menos por alguns instantes pude sonhar, reviver o encantamento de respirar livros, e descobrir nova opção quando puder adquirir alguns títulos para o meu acervo, ou como presente.
Imagino que você que leu até aqui certamente deve estar se perguntando: se eu não tinha dinheiro, como minha sobrinha saiu da livraria com o presente desejado? Bem, uma coisa posso adiantar: não furtei o livro, porém, informo-lhe que isso é assunto para outra crônica. Afinal, quem tem boca vai à livraria, e quem tem cartão pode debitar por dezenas de parcelas a perder de vista. Só não podemos perder o espírito natalino nessa época do ano e deixar um parente sem presente!

Por Haroldo Gomes 

sábado, 10 de dezembro de 2016

REPORTAGEM DA SEMANA_10_12_2016_THO HG

Redução salarial dos vereadores. Câmara garante que dará parecer ao Movimento de Ocupação nesta terça
O presidente da Casa, Sérgio Leal juntamente com o setor jurídico garantiu aos representantes do Movimento de Ocupação da Câmara que o parecer, seja contrário ou a favor, será dado nesta terça-feira, dia 13, quando ocorrerá a última Sessão Ordinária desta Legislatura.
O embate começou há quase de dois meses, quando os vereadores tentaram aumentar seus subsídios. Devido à pressão da opinião pública voltaram a trás e fixaram o teto em R$ 11.755,52. Porém, após a invasão do prédio da Câmara foi criado um movimento suprapartidário com representantes de vários segmentos sociais e profissionais que angariou mais de 40 mil assinaturas, o que redundou em um Projeto de Lei de Iniciativa Popular que pede a redução dos proventos dos vereadores para 5 salários mínimos, o que equivale hoje a R$ 4.400 por mês.
Após a desocupação do prédio, as lideranças do Movimento vinham tentando reunir com a mesa diretora para cobrar um parecer e estabelecer uma data para o Projeto ir à plenário para votação. Todavia, o que percebemos é que não há nenhum esforço nesse sentido por parte dos vereadores. Dos parlamentares que ouvimos, apenas os que não se reelegeram é que mostraram algum interesse. Ouvimos também, advogados e ex-vereadores sobre o assunto, e todos foram unânimes: “como o projeto não onera as despesas do município, ele pode ser votado, a qualquer momento, inclusive no início do ano que vem. Para isso, basta que a mesa diretora tenha interesse”.
Segundo Ruth Lopes, do Movimento de Ocupação, “seja qual for o posicionamento dos vereadores, estaremos em peso à sessão desta terça-feira (13/12). Será um dia de grande movimentação em Castanhal e no país, por conta da segunda e última votação da PEC 55, no Senado. Da Câmara seguiremos para a concentração na Praça da Igreja Matriz, onde a partir 16h ocorrerá uma grande mobilização com apresentações artística-culturais. Quando Reafirmaremos nosso NÃO à PEC do retrocesso”.

Por Haroldo Gomes