terça-feira, 20 de dezembro de 2016

CRÔNICA DA SEMANA_20_12_2016_THO HG

Entre bulas e receitas de bolo

Pela crescente onda de protestos e críticas direcionadas à classe política (ou a grande parte dela) que ocorre intensamente país afora tem como pano de fundo o não cumprimento do Artigo 5º da Constituição Federal. O qual diz “que todos sem distinção somos iguais perante a lei”. Um dos questionamentos se fundamenta pela distinção que há entre o poder exercido pelo povo e o exercido pelas autoridades constituídas. No tocante aos políticos, os do Legislativo têm a prerrogativa de criar leis e definir seus próprios salários, como também do Executivo e do Judiciário. É uma prática viciosa e perigosa semelhante ao enredo de novela das seis, em que o diretor coloca um bando de macacos para cuidar do bananal. Uma hora as bananas acabam. E quando isso ocorre, sobram apenas cascas e prejuízo. Como agora. E agora?
Não existe uma regra geral, uma vez que há exceções. Mesmo que raras. O que não é o caso de um antigo amigo; não sei se ainda é, pois ao entrar para a política ele me veio com essa pérola: “amigo, democracia só existe nas urnas”. Em partes ele tem razão. De fato, nossa frágil democracia funciona como bula de remédios. Como aquelas que vêm com o modo de usar escrito com letrinhas minúsculas (quase um teste para quem tem problemas na visão) na maioria das vezes não as lemos. Exceto quando nos automedicamos. Em geral, elas dizem uma coisa; e os médicos outra. Por analogia é como a gente ter que votar e escolher nossos representantes com uma intenção baseada em suas promessas; uma vez eleitos eles assumem outra forma de usar as leis e o poder em benefício próprio. E aí chegamos nesta queda de braço: mandamos leis de iniciativa popular para eles, e eles as desfiguram. Isso quando aprovam, como ocorreram com as Leis da Ficha Limpa e Anticorrupção.  
O escritor Rubem Alves diz que “a poesia é a ação do poeta na maneira de ver o mundo de forma diferente das demais pessoas. A beleza dessa ação chama-se metáfora”. Há sempre uma para cada situação. Claro, depende muito do poeta. Assim sendo, fica fácil de perceber que milhares de novos poetas estão surgindo e indo às ruas para contestar o país que é visto de forma dicotômica; bem diferente da que nossos representantes veem. Não há beleza alguma na miséria, na falta de médicos e remédios, de emprego, de renda... Para desnivelar ainda mais a balança, do lado do trabalhador, o Governo Federal congelou os investimentos por até 20 anos em setores vitais como saúde e educação. E assim, nesse continuísmo sem fim, nossos políticos seguem firmes a regra da receita de bolo: quando o orçamento mingua e falta fermento para aumentar suas fatias do bolo, a regra é aumentar a contribuição do trabalhador. Agora, até os idosos entraram na lista desses ingredientes. Com idade mínima de 65 anos para se aposentar vai precisar de muita sorte para usufruir deste benefício. 
Sem muito poder de reação, de nossa parte, o país sucumbe com a pandemia econômica que atinge a União, estados e municípios. Imersos em dívidas, quebrados, falidos, por teimosia de seus gestores que insistem na mesma receita: gastar mais do que arrecadam. Porém, na outra ponta da situação vemos a mesma prática viciosa há décadas. Gastança com assessores especiais, nepotismo, desvio de finalidades do dinheiro público, corrupção, sem falar nos aumentos desnivelados de seus salários e mordomias, aliás, muitas mordomias. Ai, chegou a conta, e como habitual, empurrada para o trabalhador. Ao longo do tempo o brasileiro vem aprendendo que o prato pode ser indigesto, aqui ou em qualquer lugar, mas o sabor, não. Para que isso ocorra, basta trocar de cozinheiro ou de restaurante. Nas ruas, nas redes sociais, nas igrejas e nas universidades ecoam vozes que querem de fato poder exercer o seu direito, que é trocar o cozinheiro-chefe, e assim podermos sentir o sabor dos direitos respeitados; do contrário, em breve não haverá ingredientes, e voltaremos à barbárie, como já acontece em muitos países latinos.
A língua é a beleza do mundo, capaz de aguçar nossa imaginação, de tingir pictoricamente um quadro denunciando as traquinagens dos que dela por meio de seus discursos vazios e sem fundamentos tentam furtar sua beleza. Não é lúdico que muitos políticos – sem generalidades – pensem o mundo pelo olhar de uma criança, em que todos os absurdos são permitidos. 
Não somos mais os mesmos. O país não é mais aquela creche de tempo integral em que os pais retornam ao fim do dia só para pegar os filhos sem se importarem com o que eles fizeram durante o dia. Por que, neste caso, o problema é da escola. Na nossa democracia é de todos. E dela temos que cuidar mesmo que não gostemos de política, é por meio dela que todas as decisões são tomadas e de alguma forma elas afetam o agora, o amanhã. Leiamos as bulas e ousemos participar adicionando outros ingredientes à receita, antes que o bolo simplesmente de fato acabe.

Por Haroldo Gomes

quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

CRÔNICA DA SEMANA_15_12_2016_THO HG

Ontem fui à livraria


Algo de mais em ir a uma livraria? Depende! A resposta é relativa. Talvez seja porque não encontramos livros e livrarias em toda parte e muito menos um grande número de títulos como a que encontrei ontem. Fato é que entrei nessa viagem por acaso. Uma possível explicação seja o clima de fim de ano. Estava eu apenas acompanhando a família num passeio pela capital, e em dado momento minha sobrinha teimou em querer ganhar de presente um livro. Quando me dei conta estava em meio a eles, folheando-os com a mesma sensação que uma criança tem quando ganha um brinquedo.
Entre Nélidas, Ferreiras, Maxes Martins, Rubens Alves, Pessoas, Clarices, Veríssimos, e tantas outras obras de cânones da literatura brasileira minha decepção só não foi maior porque eles não tinham o preço expresso, como é comum nas livrarias que havia visitado até então. Quando indaguei ao vendedor, fui informado que era só passar o código de barras numa maquininha leitora próximo ao caixa. Por estar descapitalizado naquele momento, foi até melhor não saber mesmo.
Do momento da concepção à distribuição há um longo caminho que os livros percorrem até chegarem em nossas mãos. Acho que é por isso que não temos lá aquela habilidade com a leitura e com os livros. Além de caros, encontrar boas livrarias em nosso estado é como procurar agulhas no palheiro. Mas naquele momento único, em meio à procura do que nem sabia o que procurava me vieram alguns devaneios:
Um deles foi me perguntar por que meu livro ainda não estava ali, no meio daquelas obras? É, tenho um livro de crônicas revisado, diagramado, pronto para a impressão: é um apanhado de escritos ao longo de vinte anos em que me aventuro a escrever. Mas antes disso tem aquela barreira que é o lado financeiro; na outra ponta da situação tem ainda o mercado com suas burocracias que freia nossas intenções de materializar tais desejos. Pensamentos vãs, e eu, ali, encantado, pegando cada um deles como se pega um cristal fino com o receio quebrá-lo.
Naquele momento ímpar me veio também outras memórias, como o convite para fazer parte de Academia de Letras. E eu convicto com o propósito relutante de sempre, e reafirmo: sem obra, não existe escritor. Salvo engano após morte, que é quando surgem interesses e a coisa anda, enquanto o autor perece no túmulo. Todo grupo social tem suas vaidades veladas, e isso me fez lembrar do saudoso Ferreira Gullar que também resistiu muito até fazer parte da Academia Brasileira de Letras. Ele devia ter os seus motivos, embora tenha escrito e publicado suas obras ao longo de sua vida. Mas, enfim, muita gente prefere o mérito sem ter algo que o justifique.
Depois de algumas horas percorrendo prateleiras, livros e mais livros, fui convidado a acordar com a sutil dica de que era hora de irmos embora. Tudo que é bom tem data de validade; a minha acabara ali. Ao menos por alguns instantes pude sonhar, reviver o encantamento de respirar livros, e descobrir nova opção quando puder adquirir alguns títulos para o meu acervo, ou como presente.
Imagino que você que leu até aqui certamente deve estar se perguntando: se eu não tinha dinheiro, como minha sobrinha saiu da livraria com o presente desejado? Bem, uma coisa posso adiantar: não furtei o livro, porém, informo-lhe que isso é assunto para outra crônica. Afinal, quem tem boca vai à livraria, e quem tem cartão pode debitar por dezenas de parcelas a perder de vista. Só não podemos perder o espírito natalino nessa época do ano e deixar um parente sem presente!

Por Haroldo Gomes 

sábado, 10 de dezembro de 2016

REPORTAGEM DA SEMANA_10_12_2016_THO HG

Redução salarial dos vereadores. Câmara garante que dará parecer ao Movimento de Ocupação nesta terça
O presidente da Casa, Sérgio Leal juntamente com o setor jurídico garantiu aos representantes do Movimento de Ocupação da Câmara que o parecer, seja contrário ou a favor, será dado nesta terça-feira, dia 13, quando ocorrerá a última Sessão Ordinária desta Legislatura.
O embate começou há quase de dois meses, quando os vereadores tentaram aumentar seus subsídios. Devido à pressão da opinião pública voltaram a trás e fixaram o teto em R$ 11.755,52. Porém, após a invasão do prédio da Câmara foi criado um movimento suprapartidário com representantes de vários segmentos sociais e profissionais que angariou mais de 40 mil assinaturas, o que redundou em um Projeto de Lei de Iniciativa Popular que pede a redução dos proventos dos vereadores para 5 salários mínimos, o que equivale hoje a R$ 4.400 por mês.
Após a desocupação do prédio, as lideranças do Movimento vinham tentando reunir com a mesa diretora para cobrar um parecer e estabelecer uma data para o Projeto ir à plenário para votação. Todavia, o que percebemos é que não há nenhum esforço nesse sentido por parte dos vereadores. Dos parlamentares que ouvimos, apenas os que não se reelegeram é que mostraram algum interesse. Ouvimos também, advogados e ex-vereadores sobre o assunto, e todos foram unânimes: “como o projeto não onera as despesas do município, ele pode ser votado, a qualquer momento, inclusive no início do ano que vem. Para isso, basta que a mesa diretora tenha interesse”.
Segundo Ruth Lopes, do Movimento de Ocupação, “seja qual for o posicionamento dos vereadores, estaremos em peso à sessão desta terça-feira (13/12). Será um dia de grande movimentação em Castanhal e no país, por conta da segunda e última votação da PEC 55, no Senado. Da Câmara seguiremos para a concentração na Praça da Igreja Matriz, onde a partir 16h ocorrerá uma grande mobilização com apresentações artística-culturais. Quando Reafirmaremos nosso NÃO à PEC do retrocesso”.

Por Haroldo Gomes 

quarta-feira, 26 de outubro de 2016

CRÔNICA DA SEMANA_26_10_2016_THO HAGAGÊ

A memória é o bilhete de passagem que permite viajar pelo tempo
Se você pudesse voltar no tempo e tivesse a oportunidade de rever e refazer algo que desse para mudar o final, o que você mudaria na sua história de vida? Viajar pelo tempo passado é um dos grandes sonhos do homem moderno (ainda muito distante). Se bem que outros ignoram o que passou e querem mesmo é ir logo ao futuro. Esse é um assunto que ainda vai gerar muita controversa.
Por enquanto, o que nos resta como recurso para deslocamento pelo tempo é a memória. Quem viveu e aproveitou cada momento da vida tem como ir ao passado facilmente. Para muitos é o que se chama de saudosismo. Assim, como recordar é viver, embora muitos prefiram completar o trocadilho com o verbo sofrer. Afinal, gosto não se discute. Acata-se.
Recorri a esta introdução por conta de que numa manhã de sábado recente, ao acordar, desloquei a mão para baixo do travesseiro para ver que horas eram. Então peguei aquele aparelhinho que mesmo quando a gente não quer sua presença, a necessidade o traz de volta para perto da gente. Amanhecer ouvindo uma boa música é relaxante, fundamental. Hábitos que só ocorrem aos sábados e nos feriados.
Queria ouvir naquela manhã um daqueles clássicos do Genesis que hoje só se ouve se tivermos um bom acervo, ou recorremos à rede. A canção abriu a porta do tempo que me levou aos anos 1980; justo naquela época em que para se ter acesso às músicas internacionais era uma agonia danada. Lembrei-me também de onde tudo partiu: da Rádio Modelo FM. A primeira rádio local que entrou no ar em fase experimental em meados de 1981, e em definitivo no ano seguinte. Tudo que é novo mexe de alguma forma com nossos brios. Para não depender da rádio que tocava as mesmas músicas uma ou duas vezes ao dia (a espera era num martírio). O jeito, então, era recorrer à tecnologia disponível na época: a fita k7, onde gravávamos as preferidas, e, assim, ouvi-las quantas vezes desejássemos.
Mas nem sempre esse processo ocorria como pretendíamos. Em geral, no meio das músicas a rádio soltava uma vinheta, o que jogava por terra todo o trabalho. A ação é conhecida até hoje por “queimar a música”. Se a fita fosse de boa qualidade podíamos regravá-las muitas vezes. Anos depois chegou a Castanhal uma loja chamada Musical Magazine. Era o point. Os vinis com aquelas capas antológicos era uma redenção para quem apreciava boa música, mesmo que não tivesse um toca discos. A sacada era procurar os amigos que tinham uma e a viagem passava a ser coletiva. A loja era o reduto para se conseguir também gravar as músicas sem as tais vinhetas. Quando não haviam os discos desejados, a gente encomendava. O que levava até um mês para chegar.
Com o celular em mãos e a música de fundo refleti o quanto ele contribuiu para mudar nossas rotinas. Cheio de recursos tecnológicos, como armazenar, baixar e compartilhar músicas, não é nenhuma máquina do tempo capaz de nos transportar por ele; porém, ajuda-nos com extrema facilidade a encontrar aquela trilha sonora que estrelou grandes e bons momentos de outrora. Ação que por si só já é uma vagem. Quanto ao tempo, passado ou futuro, isso depende do passageiro.
Por Haroldo Gomes 

sexta-feira, 14 de outubro de 2016

CRÔNICA DA SEMANA_14_10_2016_THO HAGAGÊ

As vozes das urnas

Por: Haroldo Gomes 
As eleições para escolha de representantes de cargos eletivos é uma das poucas e raras ocasiões em que o eleitor-cidadão de fato tem seus direitos resguardados através do voto. Embora ainda seja obrigatório em nosso país. Um contrassenso desde que o país reencontrou o caminho da democracia e passou a ter eleições diretas. Em cada uma delas fatos novos vêm ocorrendo. Com a deste ano não foi diferente. E foram muitos...
Passado o pleito, enquanto a maioria dos eleitos já monta suas equipes de governo e de transição, outros afinam o discurso de posse e a beca para sair bem na foto oficial. A exceção é a capital, Belém, onde haverá segundo turno para a escolha do prefeito para os próximos quatro anos. Porém, as lições deixadas ainda vão demorar para serem digeridas, principalmente por parte de quem foi vencido. Daqui a quatro anos o ciclo se abre outra vez. Se não houver mudança na lei até lá, metade desses imbróglios cai por terra, já que não teremos mais reeleição.
Embora tenhamos ouvido falar veementemente através da imprensa a respeito da suposta reforma eleitoral, ela nos parece ainda muito utópica. Com ampla incapacidade de coibir que candidatos presidiários concorram e tenham que ser escoltados e algemados em camburão da polícia até o local de votação; outros, respondendo a processos criminais ou na Lei da Ficha Limpa. Em meio a essas e tantas outras mazelas muitos se elegeram. De olho no poder, na influência, no foro privilegiado, até o crime organizado se faz representado ‘legalmente através da política’ a partir de primeiro de janeiro de 2017 por meio das inusitadas vossas excelências.
Em muitos municípios país afora o capital financeiro continua a fazer a diferença e a desequilibrar a balança ao influenciar o eleitor na hora de apertar o botão da urna. A prática do Voto do Cabresto hoje está mais para escambo – devido à mão ausente do estado em vários setores, dessa forma expõem as necessidades básicas que são trocadas pelo voto. Dessa forma, abrem-se caminhos para que muitos espertos se aproveitem deste artifício para negociar o voto e, consequentemente, se eleger -. Por outro lado, vimos o crescente aumento dos votos brancos, nulos e abstenções, uma clara sinalização de que se nada for feito, muito em breve chegará o momento em que apenas os candidatos, seus familiares e agregados irão votar; o que não impedirá que eles se elejam mesmo assim. É preciso refletir!
E as pesquisas de intenção de voto? Em alguns cenários, nem mesmo elas conseguiram reverter a vantagem em favor dos vencedores. O que deixou velado mais uma vez que eram apenas farsas. Por outro lado, continuam surgindo institutos de pesquisas de véspera de eleições espalhando-as com claras intenções: induzirem os leitores indecisos - que ainda votam nos candidatos que estão na frente. Três exemplos claros ocorrerem em Belém, Castanhal e Santa Izabel. Onde as pesquisas erraram feio!
Nesse emaranhado de fatores adversos, muitos escapam aos nossos olhos e compreensão. Vimos candidatos sem palanque, sem muito dinheiro, só com a força de vontade e a ajuda cada vez mais voraz das redes sociais desbancarem grandes e tradicionalíssimos candidatos, e consequentemente suas campanhas milionárias. Tudo isso vem reforça que algo está mudando. É muito pouco e quase imperceptível a olho nu, todavia, já nos servem de alento que apontam na direção de uma democracia mais justa e participativa, de fato e de direito.
Ainda é muito cedo para fazer afirmações pontuais a respeito desse tema. Afinal, em se tratando de política, tudo muda em fração de milésimos de segundos, de um candidato para o outro... Quanto aos ensinamentos deixados pelo pleito mais recente, é uma sinalização de que se quisermos as coisas podem mudar, como o de desconstruir o batido clichê que teima em dizer que “nesse país não se faz política sem dinheiro”.
As antigas práticas coronelistas estão sendo superadas aos poucos. Nas cabines de votação seus serviçais podem votar em quem quiser. Inclusive em branco. Se essa prática virar cultura, enfim, poderemos passar a limpo um passado enlameado por práticas abomináveis. Ainda não é a resposta definitiva, mas já sinaliza mudança de atitude e de postura política. Daqui a dois anos teremos novas eleições e poderemos aferir se o exercício da mudança vai continuar!

terça-feira, 13 de setembro de 2016

CRÔNICA DA SEMANA_13_09_2016_THO HG

Os fins de semana, nós e o silêncio
Sabe aquele silêncio peculiar do bucolismo, que só é quebrado pelo vento quando colide com as copas das árvores e em nossos rostos? Imagino que muita gente hoje em dia nem saiba mais o que foi ou é o interior. Ainda existe, em pouquíssima quantidade. Ainda é o local onde se pode armar a baladeira no pátio, nos jogar dentro dela, cumprir aquele trajeto, indo e voltando, repetitivamente sem fim, sem se preocupar com muita coisa. Claro, aos fins de semana!  
Esse desejo de fuga se dá em virtude do amplo desgaste no trabalho, da agitação peculiar das cidades, sejam elas grandes ou medianas. É sempre a mesma coisa: longas filas, e mais filas, fila no trânsito, no caixa eletrônico nos bancos, até para ficar na sombra do poste na parada dos ônibus coletivos tem fila. Somando-se a tudo isso o barulho vindo da rua, da casa do vizinho ao lado, dos carros-sons, e até das igrejas. Em toda parte temos que ouvir o que em geral não gostamos. Nem tanto pelo gênero musical, mas pelo excesso de barulho mesmo...
E por falar em trabalho, tive como chefe, algum tempo atrás, um sujeito boa praça de sobrenome Pinto. Durante o convívio, descobri porque quando perguntava se ele moraria em Belém, ele me dizia, “se eu puder evitar, jamais! Eu quero é morar em cidade que tenham menos de 20 mil habitantes”. E eu perguntava, por quê? E ele filosofava cantando a música de Roberta Miranda “Ah! Tô indo agora pra um lugar todinho meu, quero uma rede preguiçosa pra deitar, em minha volta sinfonia de pardais cantando para a majestade, o sabiá”.
Hoje, morando em outra cidade, bem menor que a anterior, compreendo porque meu amigo pensava dessa forma. Quase todos os dias é o mesmo ritual, ao chegar em casa, no fim do dia, no intento de descansar, é justamente quando os vizinhos resolvem acelerar nosso processo de surdez. Isso de um lado, porque de outro, ainda têm as igrejas – dessas que surgem todos os dias, em toda parte. Ou ainda uma terceira via, quando as duas se misturam. Um misto de Deus e o diabo medindo forças sonoramente. Aí a solução é fechar as portas de casa, arregaçar o volume da televisão para poder assistir alguma coisa, ou ir dormir mais cedo.
Usufruir o silêncio não é crime! Considerado um crime ambiental é o excesso de barulho, que nas cidades é motivo de muitas reclamações, na maioria das vezes vira caso de polícia. Agora, imaginemos aquelas pessoas que gostam de ler, um hábito que suplica o silêncio e a concentração, em geral não podem fazer o que sugere a canção “Nenhum dia”, de Djavan, em que devemos arrumar um bom lugar para ler o livro e exercitar a arte de pensar.
É cada vez mais comum aos fins de semana e feriados as estradas de acesso ao litoral no interior do estado virarem uma infindável romaria de veículos, dentro, condutores e passageiros ávidos para chegar ao destino, só para exercitar o descanso regado ao silêncio. Hoje, um bem mais que necessário cada vez mais distante. 

terça-feira, 16 de agosto de 2016

CRÔNICA DA SEMANA_16_08_2016_THO HG

Exercitando manias no fim de semana prolongado
Por Haroldo Gomes 

Com a vida corrida do dia a dia, além do salário no fim de cada mês, existem outros sonhos de consumo do trabalhador, um deles é aquele descanso merecido. Mas isso só é possível de fato quando há feriado prolongado, como o desta segunda-feira (15 de agosto). Quando isso ocorre é certeza de pernas pro ar. Os feriados quando caem na sexta ou na segunda-feira é algo tão esperado quanto o décimo terceiro salário.
Mesmo jogado no sofá ou na rede, sempre vem àquela mania de mexer nas gavetas. Ao revirá-las é inevitável não encontrar o que nem sabia ao certo o que procurava. Quem procura acha! Eu, por exemplo, cansei de ver a maioria indo às compras em busca do presente do pai, enquanto outros se deslocavam rumo ao litoral; mas no vira e revira acabei encontrando dois CD’s antológicos que há muito não os ouvia: uma coletânea de Toquinho e o álbum duplo The Wall, do Pink Floyd.
Em tempos Olímpiadas, um olho na gaveta, outra na televisão. Enquanto isso, no Rio, uma derrota no basquete, um empate no handball e a expectativa para a desconfiada seleção de Neymar mais dez, que prometia no fim de noite. Mas voltemos aos CD’s que era do que falara anteriormente em meio ao ócio remunerado merecido.
O meu exemplar do Pink Floyd estava empoeirado e sujo dado ao tempo em desuso. Quando passei a vista na capa é que me dei conta de que ele está datado a oito de março de 1996. E lá se foram duas décadas! Mexer em coisas antigas sempre me leva ao encontro com as reminiscências. Também faz parte do descanso lembrar algumas coisas boas ocorridas em minha vida. Em alguns casos, revigora muito mais. O álbum é duplo, mas, só um ainda tem algumas faixas que se pode ouvir sem que o leitor não pule, devido ao uso excessivo. Psicodelismo musical na pele!
Descanso combina também com boa música. Como admirador da produção musical brasileira e do gênero Música Popular Brasileira não poderia faltar no acervo obras de Toquinho. Refazendo audições em uma coletânea encontrei a canção “Carta a Tom”. Que me permitiu viajar pelo desabafo das coisas atrozes que até hoje nos acomete. A letra da música se funde à poesia com o clamor pelos valores morais que caíram em desuso. Tanto que chega ao ponto de sugerir que “... só resta uma certeza, é preciso acabar com essa tristeza, é preciso inventar de novo o amor...”.
E por falar em amor, o domingão foi Dia dos Pais. Sem grandes alerdes, exceto pelo apelo comercial, foi dia de lembrar meu velho pai que não está mais neste plano; e de mim, que também sou pai. Se os presentes materiais não vieram, pelo menos, ganhei um dia a mais para descansar, afinal, hoje a vida volta ao normal e outro fim de semana prolongado para exercitar essas e outras manias só no ano que vem. Enquanto isso, revigorado para a labuta dos dias que virão.

quinta-feira, 4 de agosto de 2016

CRÔNICA_DA_SEMANA_04_18_2016_THO HG

O mês do (des)gosto promete!
Por Haroldo Gomes
O mês de agosto chegou! São os primeiros dias, a primeira semana. E o que isso tem a ver com sorte e azar? Aparentemente nada! Depende mesmo da superstição de cada um. É que virou mania postagens com mensagens de textos e imagens circulando nesse início de semana nas redes sociais e aplicativo de mensagens instantâneas viralizando estereótipos ao oitavo mês do ano.
Tudo não passa de crendice. Em Portugal, as mulheres não casavam em agosto, na época em que os navios das expedições zarpavam à procura de novas terras. Casar em agosto significava ficar só, sem lua-de-mel e, às vezes, até mesmo viúva. Já na Alemanha, as mulheres não acreditam no poder mágico da superstição. Tanto que lá, as moças sonham casar no mês de agosto. Na Argentina, não é aconselhável lavar a cabeça durante todo o mês de agosto. Quem lava a cabeça em agosto está chamando a morte.
Crendices a parte, o mês do azar vai registrar muitas coisas boas, como o Dia dos Pais; e aqui, no Pará, no dia 15, uma segunda-feira, correrá um feriado prolongado. E para quem torce pela moralidade política do país está aguardando fatos importantes. Como o impedimento da continuidade na vida política de Dilma Rousseff e Eduardo Cunha.
Agosto é o mês do desgosto é um trocadilho advindo da cultura nordestina que se soma com o mais conhecido que caiu no gosto popular: “a gosto de Deus”, dando conta de que tudo fica por conta do acaso. Um exagero metafórico.
Quanto aos nomes dos meses do ano, cada um tem os seus porquês historicamente falando. É sabido que os romanos deram ao mês o nome de agosto, numa homenagem ao Imperador Augusto. Quando ao mito do azar, ele chegou ao Brasil trazido pelos colonizadores portugueses. E pelo jeito ele viralizou e ganha cada vez mais adeptos.
Crenças e superstições a parte, fato é que o tempo é mês não vão parar. Só não dá para afirmar se a seleção de Neymar vai conquistar o título que lhe falta. Muito menos se Dilma vai voltar, ou ainda se o choro sem lágrimas de Cunha foi capaz de contagiar seus pares e absolvê-lo. Só uma coisa é dada como certa: o mês de agosto tem dia e hora para acabar, que é em 31, às 23 horas e 59 segundos. Até lá, muitas coisas ainda vão acontecer, de preferência que seja mais as coisas boas. 

quarta-feira, 6 de julho de 2016

CRÔNICA DA SEMANA_06_07_2016_THO HG

Os dissabores da profissão de jornalista no Brasil


Sempre que abro meu álbum de fotografias – bem na foto, sorridente, dentro da beca, por ocasião da formatura – meus pensamentos retornam à época. E lá se vai quase uma década. Tempo de muitos sonhos cunhados que a profissão me daria, do sucesso e da realização profissional. Uma práxis semelhante à Pirâmide Invertida: que parte dos pontos mais importantes aos menos pela ordem de hierarquia dos fatos. Quando o texto fica muito longo e surge anúncio pago, ou para ajustar ao espaço, é o primeiro a ser deletado. A metáfora se encaixa perfeitamente hoje em dia aos profissionais jornalistas.
Da teoria à realidade, quantos desenganos! Os desencantos não são exclusividades minhas, imagino. A baixa procura pelo curso na última década caiu vertiginosamente; e os centenas de “focas” recém-formados para onde foram ou vão? O que devem fazer para exercer a profissão escolhida? Perguntas difíceis de serem respondidas.
Muitos colegas da época da faculdade e outros profissionais há tempos no mercado, sempre que os encontro, relatam quase sempre as mesmas coisas na mesma ordem: “amigo, estou cursando outra faculdade, uma pós-graduação; estou me preparando para concurso público. Não está dando. Arrependi-me de ter feito jornalismo”. São falas que em nada combinam com quem dedicou quatro anos da vida aos estudos. Mas que fazem parte de uma realidade perversa que acomete a grande maioria que escolheu a profissão.
Tais consequências são também fruto do que conhecemos como convergência de plataformas multimídias, mídias institucionais e ferramentas de autopublicação. A proliferação de mídias e tecnologias digitais colocaram definitivamente o pé no acelerador e desenfrearam o processo de produção jornalística. Trazendo novo adjetivo aos profissionais: o de “jornalistas 24 horas”. Já a valorização profissional e salarial não acompanham na mesma ordem. E muitos vão ficando pelo caminho. Em geral, as alternativas mais comuns são cursar outra faculdade ou fazer concurso público - que é onde o diploma de graduação em jornalismo é exigência crucial. Na prática, funciona como a Teoria do Espelho, em que os fatos são reportados ou refletidos tais quais como o são. Dura realidade que nem sempre segue essa ordem.
Numa sociedade de informação que sabe o valor deste bem para seus cidadãos, não deveria permitir que o peso e a força fossem critérios de escolhas, e sim a capacidade intelectual e a qualificação profissional. Avesso aos interesses do capital e do sistema, nós, jornalistas, lutamos para não sermos objetos de Agendamento, que possamos exercer o arbítrio profissional de definir o que é notícia e o que deve ser publicado; e não o contrário, de sermos a notícia, de não temos onde publicar os fatos de interesse que a população quer saber.
Por Haroldo Gomes 

segunda-feira, 20 de junho de 2016

LITERATURA_20_JUNHO DE 2016_THO HG

Contos, poemas e vinho tinto: uma mistura convidativa!

Até então nunca havia ganho tantos livros em minha vida como agora. A maioria já os li. Porém, à medida que vão chegando, vão entrando para a relação dos lidos e comentados. Como o mais recente, de título “Contos, poemas e vinho tinto”, do escritor izabelense Dayvid Cristian.
O vinho dispensa comentários, sempre bem-vindo em qualquer ocasião. Assim também é a definição de sua obra, que é datado de 2014, mas só agora tive acesso.
Os escritores e poetas são loucos solitários conscientes que lutam resolutamente para materializar suas ideias, obras. E sempre que isso corre merece nosso reconhecimento.
O livro em si é uma viagem interessante por meio de contos que vagam no tempo, entre o passado e o presente, em que o protagonista embora vague por outras terras, o lócus é a Belém do Pará. O estilo usado por Cristian é pouco comum entre os escritores desse gênero, ora, em primeira pessoa; ora, em terceira.
Sua narrativa descritiva é perfeita e rica em detalhes e revelações. Como falei lá no início, um pouco de loucura poética, em um de seus contos ousa revelar por meio de um diálogo com um mendigo numa de suas noitadas pelas noites belenenses sobre a possibilidade de cobrar de Deus alguns por menores. “Depois do tudo, o nada. Depois do nada, o abismo (...)”, sua poesia escorre sobre o prisma do amor, em que para traduzir, melhor ler a obra para maiores conclusões.
Quanto ao meu exemplar, ele está na estante devidamente autografado. Se ficou curioso, ainda dá tempo de conseguir o seu exemplar. Afinal de contas, uma boa leitura com ou sem vinho é sempre convidativa. Um brinde e boa leitura! 

Por Haroldo Gomes

sexta-feira, 17 de junho de 2016

COMENTÁRIO LITERÁRIO_17_06_2016_THO HG

Agora sabemos o que os homens fazem no bar

Confesso que fiquei curioso quando o Moacir Silva me disse, “Hagagê, tenho um presente pra você”, há cerca de duas semanas. E feliz da vida quando me presenteou com o livro “O que os homens fazem no bar”, do escritor Jaime Freire Campo.
O Jaime conheço dos tempos da Biasom, por intermédio do próprio Moacir Silva, isso quando eu iniciara no jornalismo. E lá se vão alguns anos. Meu caro, Jaime, não quero bancar o crítico literário, embora também seja cronista, jornalista e graduando em Letras. O livro fala por si mesmo. Haja vista que foi prefaciado pelo ilibado Tenório Nascimento.
Quero mesmo é elogiar, parabenizar-te, e te dizer: que bom que o teu eu lírico assassinou o poeta e abduziu o cronista. Que, aliás, é um misto de tudo, de todos os outros gêneros. Prova disso que falas com propriedade sobre várias temáticas, com leveza, clareza e ritmo.
É, Jaime, de fato, ninguém envelhece impunimente. As letras, o gênero crônica ganharam um aficionado lapidado pelo tempo, apaixonado e emotivo que narra com olhar clínico as indagações suas e de muita gente sobre o lugar em que vive. Dando vida, dando voz aos seus leitores.
Muitas de suas crônicas já havia lido – uma vez que durante alguns anos fui diagramador de A Tribuna – onde muitas foram publicadas. E as que não havia lido, me permiti lê-las lentamente, como quem degusta um bom vinho.
Quanto ao seu local de inspiração, quem já leu a obra, já descobriu que além de vender bebidas para pessoas que riem e falam alto, ele tem muitas finalidades. Uma delas é inspirar a produção literária. Seu livro não me deixa mentir.
Ler é criar e recriar imagens. Escrever é caminhar pelo mundo da imaginação. Quanto ao seu livro, Jaime, não me canso de bebê-lo. Então, tim! tim!

Por Haroldo Gomes

quarta-feira, 8 de junho de 2016

CRÔNICA_DA_SEMANA_08_06_2016_THO HG

Meus amigos não acreditaram!


Em uma das letras de suas muitas canções Cazuza cantava que “o bar é a igreja de todos os bêbados”. Até hoje circulam muitos discursos sobre esse local. O Jaime, cronista castanhalense, se especializou no assunto e escreveu um livro sobre o tema, a partir de observações nas mesas de bares que frequenta. Fato é que o bar é um paradoxo para os que não bebem, e uma plêiade de “filósofos” que debatem sobre tudo e todos, e, ao fim, ainda se inspiram em Raul Seixas, “aqueles que provarem que eu estou mentindo, tiro meu chapéu”.
Comecei essa crônica falando sobre bar porque ele é o local onde os frequentadores falam sobre as mazelas do futebol, da vida, da política etc. Dito isso, assistindo ao JH, recentemente, o qual destacou a faxina forçada que está ocorrendo na política nacional. Diante de tantos fatos relevantes, me veio à mente os debates acalorados que outrora travava em meu bar preferido: o Flasica, no bairro da Saudade. Para meu desespero, quando dizia aos meus amigos que se o PT caísse era uma questão de tempo e o efeito dominó atingiria os demais partidos. O Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, já pediu a prisão de vários caciques do PMDB. A maioria dos meus interlocutores dizia: “cadeia não foi feita para esses caras. Eles vão morrer no poder e nada vai acontecer”. Ainda bem que nada é absoluto!
Com a crise que se instalou no país, sobre nós, assalariados; com o preço da cerveja às alturas, quase não vou mais ao bar, isso impede que nos encontremos para darmos sequência aos debates sobre esse e outros temas. Sei também que muita gente jamais imaginou ver deputados, senadores, prefeitos, vereadores e megaempresários presos – mesmo que em domicilio, monitorados por tornozeleiras eletrônicas. Esses dias chegaram! Depois do Roberto Jeferson, agora, foi a vez do senador Delcidio do Amaral, que já foi solto, porém, foi cassado e está inelegível por oito anos e proibido de ocupar cargo público. Ufa! Um a menos.
Imagino que as pessoas de bom senso que ainda são obrigadas a votar, ou mesmo as que vendem seus votos, que ainda não haviam presenciado tais cenas na mídia, devem vibrar como um gol da Seleção Brasileira de futebol, em final da Copa do Mundo, todos os dias nos últimos meses, com o avanço da Operação Lava Jato. As investigações da PF, as delações premiadas, a revelação de escutas telefônicas têm mostrado a podridão que soterrou o país à corrupção, ao retrocesso e o levou ao caos financeiro.
Saiu um governo e entrou outro. Em apenas quinze dias desse governo novo, dois Ministros perderam o cargo. Motivo: escândalos e tentativas de obstruir a Lava Jato. Os dois episódios expuseram ainda mais a ferida aberta pela crise ético-moral na política nacional. Pelo fato de ser senador, Romero Jucá reassumiu seu posto no Senado, entretanto, pode perder o mandato, já que sua ação caracteriza quebra de decoro parlamentar; o caso pode ir ao Conselho de Ética. Vou colocar na pauta da reunião com os demais filósofos a questão da reforma política, que uma vez aprovada deverá impedir que políticos com mandato ocupem outras funções, senão aquela para a qual foi eleito.
Nós, brasileiros, temos a fama de termos memória curta. Teremos em outubro próximo eleições municipais, um bom ensaio para sabermos se o que está acontecendo seja passado a limpo, ou mantido. Fato é que a Justiça abriu os olhos e vem realizando um papel fundamental, devolvendo em parte a esperança de que nosso país ainda tem jeito, mesmo que para isso ainda leve algum tempo. 
Quanto ao bar, onde tudo começou, espero que quando ocorrer o encontro tenhamos tempo suficiente para debater tanto assunto, e que a cerveja e a crise tenham baixado. Afinal de contas, no bar, tempo só é dinheiro quando voltamos a vista para debaixo da mesa e vemos a quantidade de garrafas vazias. E quando não dá para pagar tudo, a gente pendura. No nosso caso. Com relação aos políticos de Brasília, nossa paciência não pode mais tolerar.

Por Haroldo Gomes  

terça-feira, 7 de junho de 2016

CRÔNICA DA SEMANA_30_05_2016_THO HG

É ouro, Brasil? 

O sonho de todo país é sediar os Jogos Olímpicos. De seus atletas poderem estufar no peito, no lugar mais alto do pódio, a conquista de uma ou mais medalhas. Sejam elas ouro, prata ou bronze. A vez do Brasil chegou! Porém, antes mesmo do fogo olímpico acender a pira, o que simboliza o início das competições, uma modalidade já acumula medalhas no quadro geral, à frente dos demais concorrentes.
A modalidade não é nova, mas os ‘atletas’ vêm aprimorando a técnica continuamente e se destacando. Prova disso que a cada novo assalto o recorde de tempo é registrado. Estamos vulneráveis. Eles, então, aproveitam para subtrair nossos bens. A mira preferida é o celular. Para eles é medalha que vale ouro.
A triste façanha não é garantia de maiores prêmios, muito menos de entrar para as estatísticas policiais. São tantos, em toda parte, a qualquer hora do dia ou da noite, que a maioria das vítimas sequer chega a formalizar boletim de ocorrência.
A qualidade técnica dos atletas evoluiu nos últimos tempos, destaque para as equipes do revezamento em assaltos coletivos, ou arrastões. O local escolhido tenha ou não segurança, circuito interno de monitoramento. Nada, absolutamente nada, inibe suas incursões.
Toda essa bagagem tem levado o país a frequentar o ranking dos mais inseguros do mundo. Segundo a ONG americana Social Progress Imperative – que mede a qualidade de vida em 132 países - apontou o Brasil na 11ª colocação. O principal aspecto analisado é justamente a (in)segurança pessoal.
Outras modalidade também ganham destaque, como os roubos. Entre os demais países latinos, o Brasil conquistou a medalha de bronze ao ocupar a terceira colocação. À frente, apenas a Argentina e Bolívia. Tanto que é destaque no relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). Que revelou que a taxa de roubos a cada 100 mil habitantes no Brasil é de 572,7. Claro que esse número é muito maior, já que muitos casos não são formalizados às autoridades policiais.
Maior que o prejuízo financeiro de quem tem bens roubados é a perda da vida, das sequelas deixadas quando sobrevive. Muitos atletas do crime agora investem na modalidade tiro ao alvo. Reagindo ou não, eles atiram nas vítimas, matam.

Assim como os esportes e seus praticantes, bandidos também são ídolos que influenciam o ingresso cada vez maior de jovens e adolescentes para a modalidade criminosa. Quanto à outra olimpíada e seus atores vão passar; e a nossa continuará numa gangorra sem fim. Em que nós, “patrocinadores” torcemos para que de alguma forma se não acabar, ao menos reduza, para que enfim possamos exercitar o direito de ir e vir. A prática dessa modalidade vale mais que ouro, Brasil!

sexta-feira, 20 de maio de 2016

CRÔNICA DA SEMANA_20_05_2016_THO HG

Somos interinos. Somos Brasil!   

Por Haroldo Gomes 

A fome funciona como relógio biológico que, quando os ponteiros se cruzam de meio-dia em diante, reforçado pelo ronco da barriga, anuncia que temos que ir para casa o mais rápido possível forrá-la. Hoje, por exemplo, cheguei mais tarde que o habitual. Ao abrir a porta, imaginei-me só de toalha entrando numa sauna. Devaneios de um caboclo com fome. De bate pronto, entes mesmo de trocar de roupa, resolvi ligar a tevê. Passava o Jornal Hoje.
Por alguns instantes pensei que fosse reprise do dia anterior; mas não. As mesmas coisas, os mesmos fatos, sendo repercutidos com exaustão, contribuindo para aumentar ainda mais a ferida aberta pela dor e a revolta, face às crises em que o país está assentado.
E o telejornal segue debatendo mais uma condenação de alguns mensaleiros petistas, entre eles, o Zé Dirceu. E por falar em PT, nos livramos – mesmo que de forma momentânea - de Dilma, do discurso de que foi vítima do impeachment orquestrado pelos golpistas, da inocência plena, de que não praticou crime algum. Mesmo afastada por até 180 dias, goza das prerrogativas como salário, assessoria jurídica, viagens etc., enquanto isso, fala-se de economia e corte de gastos. E a gastança promovida por Dilma e Cunha, quem as pagará?
Já passava das 13 horas, a fome aumentando e mesmo assim, eu ali, sentado, revendo o mesmo filme, impávido. Então, Sandra Annenberg anuncia os assuntos do bloco seguinte. Já quase no fim. Então, resolvi esperar mais um pouco.
Na volta, após o intervalo comercial: o rombo da dívida pública é muito maior do que fora anunciado anteriormente, afirma a nova equipe econômica. E o que isso tem a ver conosco? – Perguntou a esposa, lá da cozinha. E eu respondi, digamos que tudo.
E tem más notícias para a saúde do nosso bolso. O que pode reduzir ainda mais o nosso poder de compra. Isso significa que nas próximas idas ao supermercado o uso do carrinho será desnecessário. E que para pagar as contas da dívida pública e equilibrar a arrecadação, segundo essa mesma equipe econômica, o jeito é trazer de volta a tal CPMF, o imposto do cheque e outras medidas que a fome bloqueou o entendimento.
Uma coisa não muda: eles erram, roubam, usurpam as estatais, e no fim, quem paga a conta somos nós.
Não aguentando mais a fome. Com o término do jornal. Encaminhei-me na direção da cozinha. Em seguida, tentei relaxar, me debruçando nos braços de Morfeu. Mas o calor insuportável não deixava. No vai e vem da baladeira, as notícias ruins seguiam me perturbando o sossego.  
Não estamos em estado de sítio, muito menos em mudança de regime, porém, sem grudar os olhos, lembrei que o “país do jeitinho” vive seu ápice em meio a um tremendo frenesi: o presidente é interino; o sucessor também. Fanfarrão, é considerado, agora, presidente decorativo, uma vez que não usufrui do respeito de seus pares no Congresso Nacional. Esse cenário define muito bem o que estamos vivendo e o momento por que passamos.
Já que o vizinho ligou o som com aquele tecnobrega bacana, às alturas. O sono se foi de uma vez. E a tarde seguiu seu curso. Só não sei se à noite terei coragem, outra vez, de apertar o botão do controle remoto. O que não impedirá que mais lambanças ocorram em Brasília. Que país é esse?

sexta-feira, 6 de maio de 2016

CRÔNICA DA SEMANA_06_05_2016_THO HG

O melhor do Brasil é o brasileiro?  

O título é seguido de interrogação por uma singela dúvida: o que fazem os mais de 11 milhões de brasileiros desempregados neste momento? Aí veio a necessidade de fazer outra pergunta, diante do quadro tão deprimente, o melhor do Brasil ainda é mesmo o brasileiro?
São 22 milhões de mãos paradas, sem fazerem nada. Sem dinheiro não há consumo, sem consumo a roda da economia não gira, e se ela não girar, perde o grande, perde o pequeno. Perdem todos! O mergulho profundo na recessão e à crise econômica reduziram a quase zero 11 milhões de pessoas com vontade de trabalhar, que precisam urgentemente produzir e conseguir renda para se manter, manter suas famílias, as contas em dia. Mas tá difícil, a luz no fim do túnel está longe do alcance dos olhos.  
Os noticiários diariamente revelam rostos desfigurados, desesperados, todos os dias, nas filas dos órgãos que lidam com o emprego. As cenas emblemáticas nos remetem ao conceito que diz que o trabalho é que dignifica o homem. E sem trabalho o homem representa o que para a sociedade?
Na outra ponta da situação reside um discurso político feito sobre medida, nem sempre oportuno, de apontar culpados. A exemplo do que estamos vendo e ouvindo há cerca de um ano, na mídia. Se tudo vai bem ou aparentemente, “o governo é meu”, é propagado em primeira pessoa; do contrário, “a crise é nossa”, “o problema é de todos”.
Não tem volta o tiro disparado e a palavra proferida. Assim sendo, quando a barriga alardeia a fome, qual o sentimento de um trabalhador, de um pai de família, desempregado ao assistir aos jornais que o país está em crise, e mesmo assim, o que ele vê é corrupção para todo lado e desvios de dinheiro, muito dinheiro dos cofres públicos? Ele e os mais de onze milhões sem poderem fazer nada, morrendo à míngua, com forme, sem saúde, sem segurança, sem... Em resumo, só com a esperança de que isso tudo passe e o cenário e a realidade mudem.
Não adianta lamentar o leite derramado. Em casos assim, é melhor cuidar do que ainda restou e colocar a chaleira de volta ao fogo. Se tem um lugar onde milagres não ocorrem, esse lugar é na economia. Se há milagres, ele é operado pelas mãos dos trabalhadores e trabalhadoras que transformam a matéria prima em produtos para serem consumidos, exportados...
No meio disso tudo reside um sentimento unânime: para que o que está ruim não piore ainda mais. A banana tá cara? É a comida que restou? Dê-se por satisfeito! Pois se olharmos para trás veremos outras pessoas em situação desesperadora juntando e comendo as cascas de banana que foram jogadas. Afinal, quem tem fome tem pressa! 
SIM! O exército de brasileiros desempregados tem fome. Fome não só de encher a barriga, como também de justiça e de emprego, de tirar o nome da lista de inadimplência, de recuperar a dignidade que os corruptos usurparam não só dos trabalhadores, mas do país, que como caranguejo depois de caminhar para frente, agora, caminha para trás. 

quinta-feira, 14 de abril de 2016

CRÔNICA DA SEMANA_14_04_2016_THO HG

Novo grito: é golpe!

Por Haroldo Gomes

São comuns os gritos ecoarem de maneiras distintas, na maioria das vezes são entendidos de formas diferentes à finalidade de quem o emitiu. Alguns ficaram famosos e entraram para a história. Quem não lembra daquele às margens do Ipiranga. Controverso até hoje! Alguns anos mais tarde gritaram com a intenção de ventilar que os comunistas iriam invadir o Brasil: o resto nós sabemos no que deu. Agora, um novo grito procura eco positivo para escamotear crimes de (i)responsabilidades fiscais e improbidade administrativa.
Presume-se que a CORRUPÇÃO tenha desembarcado no país junto com as bagagens dos primeiros colonizadores, porém, a prática ganhou notoriedade mesmo nos últimos tempos, com a vinda à tona de esquemas sofisticados de roubo do dinheiro público: como o Mensalão, o Petrolão, entre outros. Dar o peixe é uma tarefa fácil; ensinar a pescar é que é difícil! Cada vez que a rede é lançada ao mar das irregularidades, graúdos homens públicos, com foro privilegiado, mandatários de cargos eletivos são pescados. Esses predadores não estão a sós, há também a participação de executivos de grandes empresas estatais e até privadas envolvidos no jogo do vale tudo para se da bem.
No trajeto sócio histórico do país até aqui a impunidade política era vista pela sociedade como um termo acessório, decorativo, já que permitia que os políticos agissem com a certeza de que seus crimes seriam protegidos pelo manto do descaso. Mas não! Contrariando a lógica, descoberto por acaso, entrou em cena há mais de dois anos o maior e talvez a mais importante sigla do país, com a maior representatividade, inclusive mais que o PT e o PMDB juntos, trata-se do Partido da Lava Jato (PLJ).
À medida que as investigações avançam, já atingindo a 28ª fase, muitos dos envolvidos para amenizar suas penas fizeram acordos de colaboração premiada, assim, novos nomes vão sendo revelados. Desde então, o PLJ começou a ir buscar graúdos bem cedinho, nas primeiras horas do dia, antes mesmo do café da manhã em suas ilhas de conforto. Tiveram que ir à justiça prestar esclarecimentos por meio de condução coercitiva, utilizado pela justiça 108 vezes. Até ex-senadores e ex-presidente da República engrossaram a lista.
O PLJ vem mudando hábitos, lançando tendências comunicativas e mexendo com a pauta dos jornais; provocando mudanças na rotina de vida de muitos políticos e empresários que trocaram seus papeis e funções sociais. De honorável prestígio para a condição de réu, preso, investigado, suspeito... Na tentativa de escapar das chamas da inquisição ético e moral os acusados usam como argumento o discurso de que o PLJ é quem está atrapalhando o desenvolvimento do país, que é o grande culpado pelas crises econômica e política profundas instaladas no país.
Difícil prever aonde tudo isso vai dar! Entretanto, os números da PLJ atualizados nos permitem fazer juízos de valor, de imaginar porque algo precisava ser feito, que algo precisa mudar para que talvez o país volte a crescer. Só para se ter um a ideia, só em propinas as cifras estimadas chegam a R$ 6,4 bilhões. Deste montante apenas R$ 2,8 bilhões foram recuperados até agora.
A República de Curitiba, do juiz Sérgio Moro, como é denominada pelas “vítimas” tem incomodado muita gente grande que se julgava intocável. Maior que suas gulas financeiras são os números alcançados até agora: 1016 procedimentos instaurados; 40 acordos de colaboração premiada; 80 condenações, o que contabiliza 783 anos e dois meses de pena. O detalhe é que a cada momento a cada fase essa lista cresce...
Tanto nas democracias liberais, como na arte expressionista os gritos ecoam de acordo com a percepção de cada cidadão ou grupo social. Em dado momento as duas convergem em torno de problemas existenciais. Com relação ao golpe, digo, ao grito pró-impeachment, o primeiro ministro-chefe nomeado e não empossado da República postulou: “quem dá ouvidos aos que defendem o impeachment está sendo manipulado pela imprensa e é desinformado”. Para as vítimas do golpe pode até soar ruim ou errado, porém, a grande virtude da democracia é que nela todos têm os mesmos direitos, inclusive de gritar! 

quinta-feira, 31 de março de 2016

CRÔNICA DA SEMANA_31_03_2016_THO HG

A revolta da mentira!


Como metástase a crise se institucionalizou e perpassou as barreiras da economia, tornando-se um duro golpe que atingiu com um cruzado de esquerda os queixos dos valores éticos e morais. Há tempos covalência. Porém, o prejuízo pode ser ainda maior. Uma vez que de repente, mais que de repente o Brasil da prosperidade, de todos por todos, deixou de ser o país de todos. Passando à condição semelhante a da Alemanha, nos tempos da guerra fria: de um lado, a Oriental; e de outro, a Ocidental. E bem no meio o muro da vergonha!
É cultural, estados, países e até nações protagonizarem embates em torno de conveniências políticas ou ditatoriais para justificarem suas hegemonias. O que chama atenção mesmo é a nossa cultura em promover revoltas populares ou político-sociais. Da velha à contemporânea República elas se tornaram signos e teimam em nos acompanhar. Ainda dá para lembrar algumas com a ajuda dos livros de história. Entre as messiânicas teve a revolta de Canudos, e como expoente Antônio Conselheiro que teve a cabeça decapitada e exposta como troféu para o governo de Prudente de Moraes. Tudo porque o messiânico arregimentou uma legião de seguidores em nome de uma comunidade menos injusta e mais acessível. Alguma semelhança com o contexto de agora?
Até para tomar vacina se tem registros de revoltas contra ela, também batizada de revolta da vacina. Osvaldo Cruz, seu grande mentor, vislumbrou o Rio de Janeiro como a “Capital do Progresso”. O que resultou em uma revolta por parte do povo que contestou além da vacina, o alto custo de vida, o desalojamento e o autoritarismo dos funcionários do governo. Por conta disso, entraram em cena as forças armadas e os bombeiros. Vencidos, os revoltosos foram deportados para o Acre. As doenças como a varíola e a febre amarela foram erradicadas; já a “Capital do Progresso” se favelizou.
Em geral, o povo foge e o bicho vence! Mas quando o povo se une a alógica se inverte. E é o que está prestes a acontecer e o esboço virar arte final. Em pleno século XXI o povo está indo novamente às ruas, de Norte a Sul, com faixas, cartazes, vestidos com roupas nas cores da bandeira brasileira e gritando palavras de ordem e dando corpo a mais uma revolta. Agora, a revolta é contra a mentira.
No epicentro, os desmandos do PT e seu líder maior, Luiz Inácio Lula da Silva, e sua retórica de causar inveja: não viu nada, nada sabe e nada tem a dizer; nega veementemente que o tríplex e o sítio em Atibaia não são seus. Como caça acuada, tenta se tornar ministro de Estado e adquirir foro privilegiado. A justiça então tirou a venda dos olhos, e desconfiada dos fortes indícios de Lula ter mentido e não ter declarado os bens supostamente adquiridos ilicitamente com dinheiro desviado da Petrobras, coercitivamente o levou para depor, e aí teve início a revolta.
A revolta atual tem elementos atípicos, uma vez que envolve a própria massa, embora esteja dividida. De um lado, os que querem Lula na cadeia e que defendem as ações da justiça. De outro, os que dizem que é um golpe, que é uma ação orquestrada, exagerada para deslegitimar o governo petista, hoje, comandado por Dilma Rousseff. E bem no meio disso tudo, um novo muro, o muro da hipocrisia, da lamentação e do retrocesso... Engessaram o Congresso e o país parou! O preço dos produtos, como a gasolina sobe quase todo dia, as pessoas morrem sem atendimento na fila do SUS, e os usuários do INSS não conseguem sequer laudos para poderem retornar ao trabalho. Longe das ideologias pró e contra a mentira: definitivamente o povo, contra ou a favor está à mingua.
Os revoltosos contra a mentira, caso sejam derrotados, terão o triste destino como os desafortunados do RJ que foram deportados para o Acre? Se a revolta é contra a mentira, é porque existe uma verdade, ou melhor, muitas verdades. Nesse sentido, o filósofo Descartes sugere que se deva acreditar num fato ou opinião quando este passar pelo crivo da dúvida. Pela reverberação país afora parece já não haver dúvidas; e sim, uma intenção velada da mentira em ser ocultada.
Em tese, a sabedoria popular diz que o mal nunca vence o bem. Assim sendo, a mesma regra vale para mentira e verdade. Que o fim tenha roteiro teledramatúrgico: em que os mocinhos vencem e o final é feliz!##THO HG