terça-feira, 26 de setembro de 2017

CRÔNICA_DA_SEMANA_26_09_2017_THO HAGAGÊ

O mundo não precisa de mais uma guerra. Precisa de paz!

Nos jornais e revistas, na tv, nas redes sociais, por toda a parte a violência circula velando e nos impondo ainda mais medo de nos tornarmos a próxima vítima dela. E agora vem o prenúncio de uma guerra mundial. As guerras são paridas pela intolerância. Nascem da sobreposição e da falta de diálogo. Além das nossas, de todos os dias, de todos os instantes, no trânsito, nas favelas, nas baixadas, nas periferias, na política, todas têm algo em comum, a arte de fazerem vítimas. Nossas casas viraram trincheiras.
Se não bastasse o clima de hostilidades que mina o mundo, o presidente americano Donald Trump e o ditador norte coreano Kim Jong-un estão a um passo de protagonizarem a terceira guerra mundial. Enquanto o diálogo se ausenta, as ofensas saltam à boca em seus discursos cheios de razões. Afinal, se ela de fato ocorrer, eles não morrerão, mas, seus exércitos.
No Rio de Janeiro o que se vê é uma guerra civil urbana. Homens do exército, da Força Nacional, da PM nas ruas, armados, tanques de guerra e a violência não dá trégua. É o estado em busca de recuperar o que tinha abdicado ao longo dos últimos anos. Enquanto isso, alunos não têm ido às escolas porque a maioria está no meio do fogo cruzado. Pais choram a morte de seus filhos, policias que tombam mortos diante do poder paralelo que parece não temer a investida do que resta do estado democrático de direito.
Em alguns estados, bandos armados impõem medo, respeito e praticam seus crimes com requintes de ousadia ao renderem cidades inteiras, ao roubarem armas de fóruns, assaltarem bancos, resgatarem comparsas de cadeias e presídios. Muitos se intitulam os novos cangaceiros. É a prática do velho banditismo que deu uma trégua, mas que retornou com força total.
Em geral, eles se organizam e atacam veementemente em estados onde os poderes constituídos se ausentaram, e isso pode ser percebido pela forma violenta como atacam e praticam suas leis. No Rio, por exemplo, que vive não só uma crise política, moral e financeira, só este ano, mais de 100 policiais perderam suas vidas e engrossam as estatísticas de vítimas da bandidagem. Se eles não resistem, imaginem nós, civis indefesos?
Aqui, no Pará, não é diferente. Até o mês passado, 26 PMs já foram mortos e 15 foram feridos. Em 2016, no primeiro semestre, foram 1.749; este ano, no mesmo período o número saltou para 1.970 pessoas mortas de forma violenta. No ranking nacional o estado ocupa a sexta colocação, ficando atrás do Rio de Janeiro, Espírito Santo, Rio Grande do Norte, Ceará e Pernambuco, que está no topo.
Ou seja, em nossa guerra mata mais que a guerra da Síria. Só no primeiro semestre deste ano, em todo o país 28,2 mil homicídios dolosos foram registrados, o que equivale a 155 assassinatos por dia e 6 a cada hora. Até agora, os números já são 6,79% maiores que o mesmo período do ano passado. Se mantida essa média chegaremos ao fim do ano na casa dos 60 mil homicídios ao ano.
Os números e a dura realidade que cada cidadão enfrenta diariamente falam por si. Diante de tudo isso, precisamos de outra guerra mundial?
Haroldo Gomes 

terça-feira, 19 de setembro de 2017

CRÔNICA_DA_SEMANA_19_09_2017_THO HG

O rock ainda vive e protesta

O que o festival “Rock in Rio” este ano menos agrega em seus palcos é justamente o rock. Uma pena! Se ele esta ausente de um lado, ao menos o sentimento de protesto e atitude ecoam na outra parte por meio dos que ali já estiveram ao levantarem a bandeira do gênero que tem mais de 70 anos e é marcado por estas peculiaridades. 
Nos anos 1985, quando foi realizada a primeira edição do evento, o grito que saíra da boca dos artistas brasileiros encontrara paralelo na liberdade de expressão, face à ditadura que chegara ao seu fim após longos 21 anos. Depois disso, chegara à redemocratização, e com ela o direito de escolhermos quem queríamos que governasse. Duro engano! 
Daquele momento até aqui, 32 anos se passaram e os motivos para se protestar só aumentaram, embora pouco se tenha visto isso por parte dos artistas, possivelmente esta inércia tenha levado o gênero a mergulhar numa decadência profunda.
Fato é que em meio ao mar de gente que está indo à sétima edição do evento para cantar, pular e se divertir, tem recebido dos artistas um incentivo a mais para liberar a voz entalada na garganta e gritar para o mundo ouvir que não dá mais para segurar.
Falar aquilo que os outros gostariam de dizer é sem sombra de dúvidas uma das facetas do rock. Se bem que por vezes, é bem verdade, escrachado. Então, o bordão do festival que representa a voz da indignação na atualidade é, “fora, TEMER!” Como o festival só termina no fim de semana que vem, até lá será possível ouvirmos este bordão mais vezes em 250 bpm.
A mistura de saudosismo, rock’n roll e protestos nos leva a revirar o baú da memória atrás daquelas letras antológicas que replicam o que ocorre no Brasil até agora. A Legião Urbana perguntou, “Que país é esse?”; o Ultraje a Rigor afirmou que tudo isso acontece porque “a gente não sabemos escolher presidente (...) tem gringo pensando que nós é indigente, inútil, a gente somos inútil”!; Os Paralamas do Sucesso também afirmaram que os culpados “(...) são trezentos picaretas com anel de doutor”. E o diagnóstico final de que nossos representantes não têm jeito foi sentenciado pelos Engenheiros do Hawaii, “Toda forma de poder é uma forma de morrer por nada (...) eu presto atenção no que eles dizem, mais eles não dizem nada...”.
Os festivais de rock teimam em serem híbridos. Então, por que não aludir o país do futebol, carnaval e samba finalizando esta crônica com um clássico de Bethe Carvalho que reporta muito bem o desatino econômico e político de outrora com o agora? “De que me serve um saco cheio de dinheiro pra comprar um quilo de feijão, me diga gente”?

Por Haroldo Gomes 

segunda-feira, 21 de agosto de 2017

CRÔMICA DA SEMANA_21_08_2017_THO HAGAGÊ

Meu pen drive sumiu!

Como é que uma coisa tão pequena assim cabe tantas coisas e quando o perdemos, danifica ou é roubado a sensação de vazio machuca tanto? É uma paráfrase daquele pagode do grupo Só Pra Contrariar (SPC), mas com objetivo completamente diferente.
Comecei musicando este texto porque toda perda tem seu lado tristeza. Então resolvi colocar um pouco de música para me fazer esquecer e aliviar um pouco. Tudo isso para falar do meu pen drive vermelho, de 16 gigas de memória, prezo a uma cordinha azul. Dentro dele, centenas de arquivos importantes. Músicas, certificados, livros e até currículos...  
Constantemente ouço pessoas se reclamando das tecnologias e pontuando seus malefícios. Claro, opiniões e pontos de vistas são subjetivos. Cada um tem o seu! Sei também que já não podemos viver sem eles. Eu, por exemplo, não posso pagar muito pela recompensa, mas se você o encontrou e quiser devolvê-lo, eu pago.
Não sei se percebeu, mas não afirmei que meu pen drive foi roubado. Não disse porque não tenho prova disso. Sei que ele sumiu e está fazendo uma falta danada. Quando dei por conta, fiz o mesmo trajeto no dia seguinte e indaguei as pessoas onde possivelmente eu poderia ter esquecido, ou deixado cair. Mas, as tentativas foram em vão.
A falta dele me fez refletir sobre como seria difícil e inusitado minha vida no dia a dia sem aquele objeto aparentemente insignificante, face ao seu tamanho. Imagine eu indo todos os dias ao trabalho e à faculdade portando uma mochila imensa cheia de pastas, folhas, arquivos, livros etc. Certamente me chamariam de maluco, ou no mínimo me comparariam com aqueles alunos de medicina com os óculos fundo de garrafa ou de direito, nos primeiros semestres do curso, cruzando os corredores da instituição com aqueles livrões em baixo do braço, só para dizer que são os caras.
Imagino que isto já tenha ocorrido com você também algumas vezes. A dor da perda é a mesma e temos algo em comum. Se tem um objeto tecnológico que tem utilidade de valor incalculável, ele é o pen drive. Tenho vários, cada um com uma função, e o genérico, que carrega um pouco de tudo. Foi justamente este que perdi. Menos mal que ganhei outro, com menor capacidade. Aos poucos a vida volta à normalidade, mas ainda navegando em busca dos mesmos títulos perdidos por mim e achado por outro. Só não sei dizer se para quem achou a função e importância são as mesmas.
Só sei que se meu pen drive (que traduzindo quer dizer pen = caneta; e drive = dirigir, ou seja, meio de transporte de dados) falasse, ele já teria regressado para mim. Enquanto esses objetos tecnológicos cada vez mais se desenvolvem, passando a caber cada vez coisas, ao passo que ficam cada vez menores, eu sigo usando o meu, que não é novo. Nem por isso deixou de ser menos importante. É como aquela máxima do senso comum: pen drive dado não se olha a capacidade!
Por Haroldo Gomes 

quinta-feira, 27 de julho de 2017

CRÔNICA DA SEMANA_27_07_2017_THO HAGAGÊ

Arquipélago atroz, ilhas demagogas! 

A forma como a ampla maioria dos políticos brasileiros governa para as elites só reforça os porquês dos contrastes que separam um dos países mais ricos do planeta, a oitava maior economia global, das inúmeras desigualdades sociais ao longo da sua história. No fundo, no fundo, estas práticas políticas nada republicanas deixam evidentes a cultura da sobreposição das elites e a manutenção do poder a qualquer custo. Processo que se agrava cada vez mais e só contribui para aumentar a distância entre ricos, cada vez mais ricos, de pobres, cada vez mais pobres.
A mais recente demonstração desta relação promíscua refere-se à legalização da grilagem pela bancada ruralista na Câmara com o aval de Temer, que se utiliza do artificio como moeda de troca para manter-se na presidência. Do outro lado, tem os dois pesos e as duas medidas da justiça que não manda para a cadeia um condenado porque ele é popular e isso poderia causar comoção. Vamos esperar que a segunda instância mantenha a condenação. Enquanto isso o outro sai correndo pela porta da frente do presídio para cumprir prisão domiciliar em casa e sem tornozeleira. Ou seja, o pau que dá em Chico nem sempre dá em Francisco.  O Legislativo não fiscaliza o Executivo e a ciranda da gentileza entre os poderes se perpetua.
Exaustivamente a mídia tem reportado que o governo não tem dinheiro para investir em setores vitais. Por conta disso, os cortes estão a galopes afetando praticamente todos os setores que não são de seu interesse político. As universidades federais, as pesquisas científicas, e até as fiscalizações de rotina nas estradas, realizadas pela Polícia Rodoviária Federal, a expedição de passaportes já foram afetados. Demonstração clara de que a manutenção do poder é que é a prioridade; quanto aos interesses do povo, continuam empurrados para baixo do tapete fadado ao esquecimento profundo.
Por outro lado, dinheiro tem bastante para retribuir a gentileza em forma de emendas parlamentares aos “colegas” que votaram a seu favor na Comissão de Constituição e Justiça – CCJ. E assim aquela velha prática do é dando que se recebe mentem-se cada vez mais recorrente. Afinal, ano que vem tem eleições!
Discurso sem reflexão é ilusão! Então, tomemos como base o pensamento do escritor argentino Eduardo Galeno, em a obra “As veias abertas da América Latina” (2004), que narra com propriedade os porquês de até hoje a história política reproduzir as mesmas práticas quando o assunto são as relações entre os países latino americanos com europeus e os Estados Unidos. “O sistema é muito racional do ponto de vista dos estrangeiros que têm poder sobre a nossa burguesia de comissionados, que vende a alma ao diabo a um preço que envergonha qualquer um com bom senso. O sistema é tão irracional para todos os demais que quanto mais se desenvolve, mas se intensificam o desequilíbrio e suas tensões, suas contradições veladas.”
No mínimo estão nos reduzindo à condição de incapazes funcionais. O que estamos vendo é a inversão do obvio. É a batalha do bem contra o mal que se instalou nas entranhas da política nacional, como um vírus quando ataca o sistema. Em meio ao bombardeio e troca de acusações tornou-se difícil sabermos quem fala a verdade e pratica o bem, e quem está mentindo e fazendo o mal nessa novela mexicana que tem como única vítima, o povo.
Em resumo, os discursos políticos são produzidos com objetivo de orientar o sentimentalismo daqueles que gostam de viajar pelo romantismo das palavras bonitas e difíceis (pura demagogia). Como as que Temer vem utilizando, chegando a postular-se de vítima e a todo custo tem procurado transferir a culpa aos acusadores, uma manobra, como se nós, que só temos direito ao voto, ou melhor, a obrigação de votar, estivéssemos no tribunal do júri, e ao fim do espetáculo entre defesa e acusação ainda tivéssemos a incumbência de absolver o réu.
A conta da gastança do governo com os aliados e as mordomias majoradas dos Três Poderes continua sendo enviada por meio de impostos para a nossa fatura. Até o pato amarelo da elite industrial já voltou às ruas. Sinal de a coisa está feia mesmo! Enquanto a força se sobrepõem à vontade popular, o governo ilha o povo que acompanha a passagem de seu governo passivamente, apenas torcendo o nariz. Muito pouco para mudar o curso desta história...
Por Haroldo Gomes

quinta-feira, 1 de junho de 2017

CRÔNICA_DA_SEMANA_01_06_2017_THO HG

Ora, labutando; ora, retirando!
Por Haroldo Gomes 

Até o presente momento - pelo que me consta - o novo ainda causa estranheza. Os motivos são os mais diversos... Quero me reportar a um fato que faz algumas dúzias de verões amazônicos que ficaram para trás, mas, à época me deixou pensativo, quando tentava aprender técnicas de redação com um professor particular. Certo dia, ao tomar a redação para corrigir, ele parou, pensou, e me disse que haveria de chegar um tempo em que precisaríamos ter pelo menos cinco habilidades profissionais, caso contrário, ainda assim, ficaríamos fora do mercado de trabalho. Disse-me isso em função do tema da redação que propusera. Essa informação ficou armazenada no meu chip até agora. E tende a continuar!  
Comecei essa narrativa rebuscando essa reminiscência nas profundezas da memória porque esta semana assiste a uma cena de uma dessas novelas que estimulam ainda mais a competição entre homens e mulheres, quando em determinado momento uma personagem enfatizou àquela frase de efeito de que “só as mulheres são dotadas da capacidade de fazer duas ou mais coisas ao mesmo tempo sem perder a concentração”.
Sem a pretensão de colocar mais lenha na fogueira dos que levam a vida numa profunda competição, que conceituam os melhores e deletam os priores. Aqui, quero falar apenas de questões de mercado, de emprego, de renda, de espaço, direitos, tanto para mulheres como para os homens que almejam a igualdade sem levarem em conta questões relacionadas ao gênero.
Se a premissa de fazer mais de uma coisa ao mesmo tempo fosse de fato determinante o mercado de trabalho não estaria mergulhado numa profunda crise. O que se vê é uma imensa fila de desempregados, e nela, mulheres e jovens. São nossas habilidades que não atendem ao mercado, ou será que foi o mercado que não se preparou para tantas pessoas qualificadas? Ou ainda tudo isso se agravou por conta da crise? E quem causou a crise?
Eu até queria falar de números, mas não sou matemático e também não tenho muito apreço por ela. Porém, quando o assunto é desemprego, enquanto escrevia esse texto o número aumentava vertiginosamente. Aí fica difícil dar números atualizados. Uma coisa é certa, no bolo dos desempregados a massa que tufa o bolo tem o mesmo valor que a dor e torna todos iguais.
Mas eu estava mesmo era falando de pessoas que têm mais de uma habilidade e fazem duas ou mais coisas ao mesmo tempo. Ou não era? Pois bem, essa coisa de fazer muitas coisas, de correr como o Charles Chaplin em sua crítica através do cinema em “Tempos Modernos”. A lógica do capital pode também nos levar a patamares semelhantes ao do Japão, onde a doutrina é viver para o trabalho. As consequências são a depressão e as altas taxas de suicídios. Com tanta pressa caminhamos neste sentido também?
Aliás, correr faz bem à saúde. Não de carro pelo trânsito louco todos os dias nas médias e grandes cidades. Acho chique pilotos de carro circulando pelas ruas da cidade com parte do braço apoiado à porta e a outra ao volante, e na outra mão, um cigarro. E de vez enquanto, quando o celular toca, o piloto exerce mais uma função. Embora seja infração gravíssima. Mas, e daí? O importante é ser proativo: dirigir, fumar e falar ao celular ao mesmo tempo igual a um piloto de fórmula um correndo de um emprego ao outro, ou simplesmente para chegar em casa. Já ia esquecendo que o trânsito brasileiro faz vítimas em proporção a de uma guerra. Seria essa uma das motivações parta tantas vítimas?

Essa coisa de fazer muitas coisas ao mesmo tempo também me reporta a uma frase da escritora Cecília Meireles, a qual diz que o mais importante não é a velocidade, e sim a direção para onde vamos. Chegar ao objetivo é consequência de quem determinou para onde queria ir. Claro, no meio do caminho sempre existirão obstáculos, mas é sabido que uma hora chegaremos lá. E nem tanto por fazer duas ou mais coisas ao mesmo tempo; mas por fazer bem feito aquilo que nos propusemos a fazer.

quarta-feira, 26 de abril de 2017

CRÔNICA_DA_SEMANA_26_04_2017

A viralização da violência

Embora as autoridades de Segurança Pública não admitam, estamos em meio a uma guerra urbana sem precedentes que faz vitimas a esmo, e se existe uma palavra que pode resumir a nossa sensação nesse momento crítico, ela se chama SOBRESSALTO. Estamos sendo mutilados literalmente pela violência – física ou psicológica - desenfreada que não poupa ninguém. Nos últimos tempos tenho renunciado apertar o botão do controle remoto da TV, pois quando aperto me vem a sensação de que é repetição do programa anterior (vale a pena ver de novo?).
Os mesmos fatos têm pautado os noticiários com frequência, claro, com novos desdobramentos. Corrupção, delações premiadas, escândalos políticos, milhões para lá, bilhões para cá, e algo em comum de ambas as partes. Da nossa: de que não vai dar em nada e com o passar do tempo vai cair no esquecimento como tantos outros casos. Da outra: o sentimento de impunidade velado, tanto que nada tem sido capaz de inibir a prática e os crimes continuam cada vez mais e mais sofisticados.
Quando não são as peripécias dos políticos é a violência extremada que atingiu os mais elevados patamares. Já não podemos mais ficar em frente de nossa casa, ir à esquina comprar algo, ou passear em praça pública que somos vítimas em potencial da bandidagem. E se não tivermos nada para pagar o pedágio a repressão é maior e mais violenta. Por conta disso, o que ouvimos, vemos e lemos nos jornais todos os dias é o derramamento de sangue. Assassinatos, mortes violentas que não poupam nem os militares. Execuções, assaltos com reféns, chacinas, mortes, mortes e mais mortes...  
A violência hoje em dia tem público cativo, dá audiência, têm programas especializados em horário nobre, cadernos etc. e no meio disso tudo tem sempre alguém quer saber de tudo, dos bastidores, detalhes, e se possível até investigar. Todo esse espetáculo da vida real é proporcionado pelas plataformas digitais disponíveis, como as redes sociais e aplicativos de mensagens instantâneas. Mesmo que não queiramos saber, somos tentados por membros de grupos dos quais fazemos parte que fazem circular informações dessa natureza em tempo real. E quando aquela musiquinha toca ou o aparelho vibra é a informação de que chegaram mensagens novas. Difícil não abrir, e, assim, ao entrarmos em contato com elas também fazemos parte da midiatização.  
Com a banalização da violência e a ânsia de dar um furo (como um foca em início de carreira) de midiatizar a informação e com a febre das selfs é comum presenciarmos pessoas mais preocupadas em registrar e divulgar o fato a ajudar a pessoa tombada ao chão. É uma teia, todos querem ser o primeiro a divulgar e os demais querem ser informados sobre a novidade e poder comentar.

Quanto à violência, os homicídios e à insegurança no empurra-empurra de competências nos resta a condição de protagonista como na canção “E agora, José”? Já que não temos para onde fugir, o jeito é cumprir a sentença condenatória que nos imputou prisão domiciliar; mesmo sem termos cometido crime algum. Usufruir o direito, até então sagrado, de ir e vir se tornou uma regalia. Em casa não estamos imunes, paliativamente menos expostos. Até quando? 

terça-feira, 18 de abril de 2017

CRÔNICA_DA_SEMANA_18_04_2017_THO HAGAGÊ

Cada buraco no seu quadrado


Aqui na Amazônia as estações climáticas se dividem em duas: uma que chove mais e a outra que chove menos, sendo que praticamente todo dia chove o dia quase todo, a qualquer hora. Fenômenos da natureza têm dessas coisas que pouco podemos fazer ou contestar. Ela despenca do céu à vontade como as águas que jorram das mangueiras dos carros pipas durante operações anti-incêndios.
Depois que o céu para de chorar é possível perceber os impactos, principalmente nas cidades, expondo facilmente as fragilidades estruturais como sistemas de esgoto, pavimentação asfáltica e drenagem. Mas são nas vias que surgem os personagens indesejáveis para muitos e adorado por poucos que sabem tirar proveito dos buracos.
Na cidadela Esquecida tem uma rua chamada Lamentos, que cruza a cidade de uma ponta a outra, e bem no meio, próximo à esquina com a passagem Descaso tem um cemitério, e na frente reside um buraco muito resiliente. É bem verdade que ele é um pouco a mais que os outros infindáveis numericamente existentes. O pessoal da prefeitura até entope, paliativamente, mas toda vez que chove e com o intenso vai e vem de veículos ele é aberto.
- Eu adoro ficar assim: aberto, tomando banho de sol durante o dia, e ainda posso tirar sarro do meu amigo buraco Cova, que fica ali, do lado de dentro. Só vê o movimento de pessoas quando tem enterro ou no Dia de Finados, quando lhe dão muito trabalho. Comigo não, a coisa é diferente. Quem dá trabalho sou eu!
- Bom dia, amigo Buraco Rua.
- Bom dia, doutor Cova.
- Aliás, por que doutor?
- Porque você é muito formal. Até para serem enterrados em você tem ritual. Engraçado, não faz tanto tempo que você foi entupido, e já está na ativa. Apesar de tudo, eu quero mesmo é falar sobre nossos trabalhos, importâncias e contribuições sociais.
- Verdade, amigo Rua. Sabes de uma coisa, eu estou convencido de que sou o mais importante para a sociedade, de que meu trabalho é que contribui incisivamente para o bem-estar das pessoas.
- O que fez você pensar assim?
- Pensa bem, com exceção das pessoas que são cremadas, que, aliás, são poucas, as demais são enterradas em mim. Eu fico ali parado, assistindo as pessoas se despedindo de quem morreu e logo em seguida sou fechado, claro, por pouco tempo, é bem verdade. Como tem morrido gente nos últimos tempos. Parece até que estamos em guerra. É um abre e fecha danado. Além disso, quem se deita em mim, fica em paz, descansa. Mas me conta, e você?
- Descordo plenamente da sua opinião. Quem é mais importante sou eu. Eu até promovo a riqueza de quem se especializou em cuidar de mim nas cidades e até no campo, em alguns casos, ainda lhe ajudo, Cova. Pois como sou a maioria nas ruas e estradas desse país, muitos até tentam desviar de mim, mas acabam se acidentando e indo parar dentro de você. Se os governantes cuidam para que eu fique mais tempo aberto é porque sou importante.
- Muita presunção de sua parte. Sei que existem muitos outros irmãos buracos importantes nesse país e que fazem sua parte com grande primor. Veja por exemplo o imenso buraco abertos na dívida pública!
- Estás enganado. As pessoas e fatos importantes dão IBOP, são falados, comentados pela opinião pública e na imprensa, ou não tens assistido aos telejornais? Não faz muitos dias que fui matéria até no Fantástico. Quase que peço uma música.
- Está chegando mais uma pessoa para ser enterrada. Agora tenho que ir cumprir minha missão. Depois nos falamos. 
Agora eu vou tomar meu banho de sol, afinal, daqui a pouco vem a chuva e eu vou ficar cheio d’água ou submerso. Se bem que assim é melhor, ninguém me vê e não poderá desviar. Como é bom ser buraco no Brasil. Quando eu crescer e me tornar presidente vou colocar como slogan de meu governo: “O futuro começa aqui”!

Por Haroldo Gomes 

segunda-feira, 20 de março de 2017

CRÔNICA DA SEMANA_20_03_2017_THO HG

Funk moribundo das carapanãs resilientes
Eu bem que poderia começar esta narrativa de outra forma. Mas a tentação de escrever fazendo analogias é maior, às vezes fica mais divertido ou mesmo lúdico, o que leva o leitor até o fim para ver o desfecho. Essa é a intenção! Então resolvi me aventurar em falar sobre algo de que não tenho conhecimento técnico. Mas a vida requer iniciativas, ações; caso contrário, tudo fica linear como as novelas da atualidade em que o fim é previsível. Uma hora tudo cansa. Essa não a intenção deste texto. Então vá adiante e leia o próximo parágrafo!
Eu e minha esposa mudamos para a nova casa recentemente, mas algo não mudou: a presença incômoda e constante das carapanãs. Mês a pós mês sempre repetindo o ritual de colocar inseticidas a mais no carrinho de supermercado. E toda noite o roteiro é o mesmo: fechar a casa e colocar o veneno e dar alguns minutos do lado de fora para só depois voltarmos. De início funcionou. Mas as carapanãs se adaptam ao veneno e continuam vivinhas. Depois ainda zombam da gente dando aqueles voos rasantes próximos aos nossos ouvidos produzindo aquele som zum, zum, zum, justamente quando queremos dormir, como quem diz: “eu estou aqui e só vou me retirar depois que jantar teu sangue”.
Percebi, então, que era preciso mudar de tática, afinal, o período chuvoso está aí e é a época em que as carapanãs mais se proliferam, parecendo político em época de campanhas eleitorais, quando estão em toda parte; ação contrária às carapanãs que não somem por quatro anos. E toda noite é aquele tormento. Sempre que passo em frente a algum camelô fico olhando aquelas raquetes que torram insetos, como as carapanãs, e me bate o desejo de compara uma, mas como é produto importado tenho resistido em adquirir uma.
Vendo minha aflição noturna e as tentativas em vão de eliminar as carapanãs minha esposa me preparou uma surpresa, mas não sem antes me torturar também. Na semana passada, ao chegar para o almoço, ela me disse: “quando você voltar da faculdade tem uma surpresa para você”. E eu, conta logo! Mas ela firmemente relutou em me dizer. No retorno, durante a viagem, me preparei como um adolescente ávido para o primeiro encontro com a amada. Quando cheguei, procurei logo retomar o assunto. Então, o que é a novidade? Sem titubear, para minha surpresa, me deu uma raquete elétrica já carregada. A emoção me tomou conta e foi só partir para o ataque. Segui pelos cômodos da casa como um jogador de tênis no saibro de Roland Garros, e ela, me seguindo de perto, morrendo de rir da minha felicidade excessiva executando meus saques indefensáveis às carapanãs. Estalos para lá, estalo para cá. E a partida seguiu na primeira noite até que a bateria descarregou completamente. A satisfação não poderia ser maior quando voltei os olhos para trás e vi centenas delas mortas e outras tantas tostadinhas entre as lâminas elétricas da raquete. Imaginei, ganhei a partida!
A título de curiosidade, Carapanã é um nome cunhado do dialeto indígena (tupi) conhecido assim na nossa região, todavia, nas demais regiões do país o inseto recebe outras denominações como muriçoca, pernilongo, sovela e mosquito prego. O ponto de convergência entre suas peripécias é quanto à forma de se alimentar, que é o nosso sangue.
Se tem um inseto resiliente neste mundo ele é a carapanã. A gente mata uma e surgem centenas. Pelo jeito aqui, em casa, estamos longe do fim da partida em que aponte para nossa vitória. Por enquanto a novidade é que preciso devolve gentiliza e adquirir uma raquete para exercitarmos o jogo de eliminação de carapanãs juntos. Afinal de contas, de tanto me tirar sarro, agora é ela quem vive como uma tenista no auge da carreira desferindo sua técnica nas carapanãs. Somos apenas dois frente ao exército de carapanãs.
O que nos serve de alento e motiva a resistir é saber que a tecnologia está aí para nos ajudar a termos um pouco mais de poder de reação, mesmo sabendo que elas são brasileiras e não vão desistem nunca. Se elas querem nosso sangue, tomarão nosso sangue só no fim, só assim. Assim, seguimos no ritmo do zum, zum, zum, perseverantes no enfrentamento à base das raquetas. 

sábado, 14 de janeiro de 2017

CRÔNICA DA SEMANA_14_01_2017_THO HG

O ritual emblemático da passagem de ano

Se tem uma coisa lúdica nesse mundo, ela se chama a passagem de um ano para o outro. Ninguém vê e nem pode tocar, mas esperamos como se fosse um portal que se abre e nos leva do antigo mundo para o novo, com a esperança de que ao passar por ele tudo vai ser diferente. Mas para isso tem um ritual imprescindível, como fazermos contagem regressiva, soltar fogos, pular sete ondas na praia, estar vestido de branco e quando chega o ápice, o momento zero, à meia-noite em ponto, queremos logo ser a primeira pessoa a abrir os braços e desejar feliz ano novo a quem gostamos. Pelo menos comigo sempre foi assim. E com você?
A cada novo ano, logo no início, procuramos elaborar planos de como fazer para ser diferente no final. E quando o momento se aproxima percebemos que ficou quase tudo para cima, para a última hora e os atropelos são invitáveis. O do ano passado para este não foi diferente. Chegamos ao local desejado para ficarmos juntos em família já quase à noite. E corre pra lá, e corre pra cá, mas no fim deu certo. Como sempre deu! E no meio disso tudo não tive como não lembrar de quando era criança, quando meus pais faziam exatamente o mesmo ritual, e eu querendo ficar acordado para saber como era a tal mudança de um ano para o outro que todos os adultos tanto falavam.
Entre este e outros devaneios, lembrei-me também de um gibi da Turma da Mônica, em que a personagem Chico Bento, um caipira juvenil tinha essa mesma curiosidade de ver como era a mudança de um ano para o outro. Como disse e repito, é lúdico por demais. Por instantes me identifiquei com a personagem, que na trama dos quadrinhos tinha essa mesma curiosidade. Porém, à medida que cresceu ficou acordado para ver como era e não gostou do que viu: da tamanha loucura que é as pessoas pulando, bebendo, gritando, se abraçando efusivamente e extravasando os sentimentos, desejando tudo bom as pessoas que queremos bem e a nós mesmo, claro.
Muitos extrapolam e amanhecem o dia e o ano começa com os olhos vermelhos como se aquele fosse o primeiro e último dia do ano. Mas a maioria vai deitar um pouco mais tarde e aproveita o dia seguinte, que é também o Dia Mundial da Paz, e continuar degustando o que sobrou da noite do ano anterior. Para muitos este é sem dúvidas o melhor da festa, uma vez que já passou toda aquela ansiedade e já estamos em um novo ano.
O ritual da vida cotidiana é cíclico e a roda não pode parar. Prova disso que no dia posterior a vida volta ao seu ritmo normal de atividades e segue seu curso, com as mazelas políticas, econômicas etc. Mas temos também aquela capacidade de superação amparada nas alegrias das coisas boas que nos causam felicidades, como conseguir aquele trabalho melhor, estudar e, claro, os sonhos, de realizarmos e darmos aquela guinada na vida.
Uma coisa que não devemos fazer, é agir como o caipira Chico Bento, que ao ver tudo aquilo que lhe parecia estranho, deu meia volta, e retornou para a cama, e deixarmos de lada cada momento único, com ou sem explicações é o melhor, haja vista que passou, não volta mais.
Um brinde ao ano de 2017 que já começou, com ou sem encantos a vida real não tem regravações e como tal não vai parar para lamentarmos. Então, vamos pra frente que para trás não dá mais...

sábado, 7 de janeiro de 2017

REPORTAGEM_DA_SEMANA_07_01_2017_THO HG

Aos 83 anos, hoje o povo te abraça 
mais forte, Santa Izabel do Pará
Complexo esportivo: principal cartão postal da cidade, na entrada, sentido de quem vem de Belém.
Uma vasta programação artístico-cultural marca durante todo o dia de hoje (7) as comemorações de aniversário dos 83 anos de Santa Izabel do Pará. Localizada às margens da BR 316, o município é conhecido na região e até fora do país como a cidade dos igarapés, além da ampla vocação para o turismo ecológico e também pelas iguarias feitas a partir da farinha de tapioca. Seu povo mira o futuro sem abrir mão dos  valores socioculturais.
O clima de festa por parte dos cidadãos contrasta com a missão que seus gestores terão pela frente, que é superar ou mesmo minimizar problemas estruturais como saúde, segurança e geração de emprego, fazer com que os munícipes não se desloquem para outros municípios em busca de oportunidades.
Seu Itamar Fernandes Ribeiro, memorialista, escritor e ex-prefeito, no alto de seus 77 anos, não hesita em afirmar que “hoje não há muito o que comemorar. Houve um tempo que sim; mas hoje não! A cidade parou no tempo”. Ainda segundo ele, “nos últimos dez anos que o município começou a dar os primeiros passos para deixar de ser um centro agrícola, uma vez que o comércio vem procurando acompanhar e atender as necessidades do izabelense e de pessoas de outros municípios que aqui vem fazer compras”.
Esse misto de resgate da memória, preservação e desenvolvimento futurístico se funde com os valores culturais, sociais e familiares que se encaixa perfeitamente a um projeto estético chamado “izabelismo”, desenvolvido pelo jornalista e escritor Luiz Augusto Paixão (31) com um grupo de amigos. Para Augusto, aos 83 anos, Santa Izabel, tem muito o que comemorar, sim. “Mesmo o nosso povo não tendo muitas oportunidades aqui, a maioria vai e volta. Essa é uma marca que vem desde o início da sua história, mesmo com tantas adversidades, quem vai, em geral retorna, por ser o melhor lugar para se viver. Essa é a nossa grande marca”.

Convergência
“Uma prova do que falei anteriormente sobre a falta de oportunidades, com relação à geração de emprego e renda pode ser comprovada a cada quatro anos, como agora, você não pode nem circular pelos corredores da prefeitura e secretarias, toda cheias de pessoas em busca de uma ocupação, e esse local ainda é a Prefeitura”, exemplifica seu Itamar. O jornalista Augusto completa, “essa é uma marca das elites dominantes que se revezam no poder há décadas e utilizam este artificio com fins eleitoreiros. Para acabar com isso, o remédio é o exercício pleno da cidadania e a educação para tirar a cidade desse atraso e colocá-la no caminho do desenvolvimento pleno”. Porém, seu Itamar enxerga pontos positivos e avanços, a exemplo das culturas hortifrutigranjeiras, que juntas colocam a cidade como uma das mais bem assistidas, chegando, inclusive, a exportar seus produtos para outros estados, além de gerarem emprego e renda.
Foto 1, seu Itamar Fernandes; ao lado, na foto 2, o jornalista e escritor Luiz Augusto Paixão.
O que os define izabelense hoje?
“O senso de humor do izabelense como antídoto para superarmos as adversidades da vida cotidiana”, Luiz Augusto Paixão.
“Sou suspeito em falar. Para mim é o melhor lugar do Mundo. Digo isso porque o povo me deu a oportunidade de ser seu representante. Coisa que jamais havia imaginado. E por isso sou muito grato a Santa Izabel e ao seu povo”, Itamar Fernandes Ribeiro.