Se o
pedreiro Amarildo fosse professor, Polícia Pacificadora, do RJ, o deixaria dar
aula?
Por Haroldo Gomes
Quantas
pessoas já morreram por engano em nosso país, vítimas da (in)justiça com as
próprias mãos ou de policiais? E quantas ainda haverão de morrer sem ter a
chance de se defender? Outro dia, em um programa jornalístico, na TV Brasil, o
cineasta José Padilha disse que a segurança pública de nosso país há muito
atende pelo nome de “barbárie”.
A barbárie a
que se refere o cineasta é a que vigorava quando ainda não se tinha definição
de estado civil, de estado com organização política, de ordem, de direitos e
deveres, individuais e coletivos. Era quando a força e o poder se sobrepunham deliberadamente,
ou seja, cada um fazia o que queria segundo suas vontades e interesses. Estamos
caminhando nesta direção novamente?
Fatos como os
corridos com o pedreiro Amarildo, no ano passado, e o professor de história André Luiz Ribeiro, na semana passada,
não foram e não são casos isolados, eles reforçam um questionamento, digamos, audaz:
deve prevalecer a intolerância, a impunidade e o julgamento prévio em casos que
não cabem tal prerrogativa a quem se julga no direito, pelo puro e simples prazer
de fazer justiça? O Estado precisa manter a ordem, promover a tolerância e garantir
os direitos dos cidadãos...
Amarildo foi
levado para prestar depoimento em uma unidade de Polícia Pacificadora, na Rocinha
(RJ), após supostamente ser ouvido, saiu em uma viatura da PM e nunca mais foi
visto. Já o professor de história, em São Paulo, para não ser linchado pela
população, quando foi abordado por um grupo de Bombeiros e para não ser preso, teve
a ideia de dar aula para provar aos militares que de fato é professor e que a
ação violenta de quem o confundiu com um assaltante era um equívoco.
A aula que o
professor de historia deu foi sobre a Revolução Francesa, justamente a revolução
que desencadeou para o restante do mundo, o mundo das ideias, dos ideais de
liberdade, de como o estado deve se posicionar na manutenção da organização
individual e coletiva.
Hoje em dia,
conceber prejulgamentos a alguém baseado na estética, vestimenta ou pelo poder
do discurso é um absurdo, afinal, estes indicativos não provam nada. Bandidos
usam paletó e gravata, ambulantes usam terno de grife, na dúvida o que fazer
diante de casos como estes?
Correto está
o pensamento produzido pelo senso comum, que diz: “quem vê cara não vê
coração”. O professor Luiz Ribeiro pôde provar o que era porque as autoridades
lhes concederam o direito de se expressar, como manda a Constituição Federal
que reza o direito à ampla defesa. Já o pedreiro Amarildo falou, mas não lhe
deram ouvidos. Resultado: um grupo de 10 PMs está preso e há indícios de que o
pedreiro foi mesmo morto pelos polícias, entretanto, mais de um ano já se
passou o corpo ainda não foi encontrado.
Enquanto
parte dos Poderes constituídos responsáveis por setores vitais como a Segurança
Pública e a Justiça camuflam ou escamoteiam o princípio do direito garantido em
detrimento de interesses pessoais ou de grupos, no front, nas ruas o desejo de justiça com as próprias mãos só tende a
aumentar, produzindo vítimas todos os dias, de Norte a Sul do país, umas inocentes,
outras nem tanto. Entretanto, em quase todos os casos que se tem registro, como
os dois exemplos citados aqui, os julgados não tiveram e não terão o direito de
falar ou de se defender. O professor de história fez história ao ser uma exceção.
Mas, até quando vamos tolerar, ou viver assim?
Nenhum comentário:
Postar um comentário